sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A Luta e a Morte de Elaine César

   Elaine César, 42 anos, pessoa que talvez não tivesse conhecido não fosse nossas histórias parecidas. A de Elaine é ainda mais dolorosa e injusta. Fotógrafa, documentarista, trabalhava na renomada e aplaudida trupe do controverso (como todas as pessoas geniais) Zé Celso. Grávida do segundo marido, vê sua vida mudar quando oficiais de Justiça invadem sua casa e apreendem seu material de trabalho: computadores, DVDs, material de pesquisa. Tudo seria levado para investigar a acusação de abuso sexual que seu ex marido e pai de seu primeiro filho, fez. A guarda também foi "transferida" para o pai. O menino foi levado da cidade de São Paulo para Brasília e Elaine proibida de vê-lo, não fosse sob monitoramento.
  Até aí várias semelhanças. Só que Elaine já estava grávida de seu segundo filho. E descobre que tem câncer linfático. Então sobreviveu ao calvário de perícias, ações, audiências, idas e vindas de avião (até onde seu corpo aguentou), de 15 em 15 dias, para ter alguns momentos com seu filho.
  Não lembro se foi ela que me procurou primeiro ou o contrário. Mas li dois posts de seu blog Gravidez, Câncer e Alienção Parental e acreditei em todas as palavras. Era uma profissional de sucesso, com sólida carreira num meio disputado, árduo, tortuoso. Era linda, inteligente, com milhões de amigos. Escrevia com alma, com sentimento, com amor. Só podia ser tudo verdade mesmo. Com ela aconteceu igual. Não precisei provar nada, acreditava em todas as minhas palavras. Quando viu a matéria no Profissão Repórter, então, como conhecedora das artes cênicas - casada inclusive com um ator - reconheceu a canastrice e impáfia da outra parte.
   Então passamos a trocar emails de desabafo, alguns muito engraçados até e também ideias de trabalho. Ela estava numa produção acelerada, escrevia compulsivamente, ideias brilhantes que ainda não poderiam ser executadas.
  Confessou que quando me procurou foi pensando em fazer um documentário sobre o meu caso e de Dora, mas depois percebeu que tudo isso era muito maior. Eu mesma me encarreguei de levantar várias injustiças parecidas, de filhos arrancados das mães por ex vingativos e por negligência judicial. Passamos a nos escrever com mais frequência. Só quem passa por isso, ser separada de um fiho pela Justiça e injustamente, sabe o tamanho dessa dor, dessa raiva.
  E num desses dias que a gente acorda só querendo escrever uma carta de despedida, porque parece impossível vencer a dor da saudade e lutar contra um sistema inteiro, escrevi um texto deprimente e postei. Para minha sorte Elaine César e Cassandra Melo (atriz, uma de suas melhores amigas) foram das primeiras a ler. Elaine entra online: "tira isso agora e me liga já!". Obedeci como a criança que fez "arte". Chorava tanto que não conseguia ligar... como posso ser tão covarde?
  Cassandra me ligou e foi assim que tive contato com essa outra alma fantástica. Uma rede de apoio surgiu quando eu estava rompendo ao meio. E Elaine, do alto da sua gravidez de risco, vítima de uma acusação hedionda e na batalha contra uma doença cruel, me confortou. Quanta luz!
  Sempre dizia para ela como achava incrível que uma única pessoa péssima era capaz de causar um estrago que 500 boas não eram capazes de consertar. Foi isso que fizeram os pais de nossos filhos. E combinamos que nossas crias seriam amigos, porque só uma criança que passa por isso pode entender a outra.
  O filho de Elaine voltou para ela, logo depois que o caçula nasceu, muito saudável, por sinal. A Justiça percebeu o crime que estava fazendo, separando o filho da mãe, que estava com uma doença fatal. Será que ter enfrentado tudo isso junto não minou suas forças?
   O brilho dela era intenso. Não exagero em dizer que foi uma perda para a raça humana, porque, além de tudo, essa mulher era uma multiplicadora de opinião. Sua forma sensata de encarar o insustentável é a evolução da espécie. Ainda bem que deixou registrada sua história, que não parou de escrever. Seus filhos sempre saberão quem foi essa mãe maravilhosa, que nunca desistiu de lutar. Assim como fazem os heróis de verdade.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Carta Aberta ao Médico Psiquiatra Infantil José Hércules Golfeto

   Além da especialização na infância, esse médico é também avô de minha filha Dora, de 10 anos. Há um ano e meio Dora mora em sua casa e ele não permite que nos falemos ao telefone

   Senhor José Hércules Golfeto, como não entendo suas respostas, nas poucas vezes que falou comigo ao telefone e não o desligou na minha cara, venho por meio dessa suplicar que responda também publicamente, para que mais pessoas tentem entender tamanha contradição. Gostaria também que mais pessoas soubessem, principalmente àquelas que confiam seus filhos aos seus cuidados psiquiátricos, o que o senhor admite dentro de sua própria casa. Pior, o que faz com sua própria neta, uma criança, de 9 anos.
  É fato que Dora Mendes Golfeto, minha filha tão amada, foi levada com busca e apreensão de menor, no dia 10 de fevereiro de 2011. Está tudo devidamente documentado pela equipe do Profissão Repórter, da Rede Globo. Outro fato é que tenho vários emails do senhor dizendo que jamais fariam busca e apreensão. Afinal, seria extremamente traumático para Dora ser arrancada da mãe, diz ainda que deveria voltar a ter contato com a família paterna aos poucos.
  Pois Dora foi levada. E diretamente para sua casa, em Ribeirão Preto. Outro fato é que até então Jonas Golfeto, seu filho e pai de Dora, morava em São Paulo, no bairro de Perdizes, na rua Diana. Até abril de 2011 fiquei sem saber onde Dora estava morando e o senhor, que até então atendia minhas ligações em seu consultório, dizia também não saber. "Jonas não me conta nada, sabe como é meu relacionamento com Jonas, só meias palavras". A verdade é que Dora já morava em sua casa. Já estudava no Colégio Albert Sabin, já bailava...
  A partir do momento que descubro tal fato o senhor me proíbe de falar com ela. Ligo diariamente, várias vezes por dia. Não atendem, quando atendem, desligam. Quando o senhor, desprevenidamente atende, diz que não manda nada, quem manda é Jonas, ele tem a guarda, ele decide. O fato é que Dora mora em sua casa. O senhor pode sim chamá-la e dizer para que atenda sua mãe. Mais que isso, pode liberar Dora para que fale com a mãe, com a irmã e com todos os amigos de quem foi brutalmente afastada.
  Diga-me, doutor psiquitara José Hércules Golfeto, me responda e a todos os pais que se preocupam com a saúde mental de seus filhos: o senhor concorda em afastar uma criança de 9 anos de sua  mãe? Proibi-la de ter contato com qualquer pessoa que tenha feito parte desses seus primeiros 9 anos de vida?
   Dora é uma "criatura fantástica", em suas próprias palavras, em email que me endereçou. Ora, se é tão educada, meiga, disciplinada, inteligente, carinhosa, atenta... quem a criou mesmo? Fui eu. Por mais que eu tenha errado, criei uma "criatura fantástica". E estou criando outra. Por mais que vocês tentem fazer Dora esquecer, ela tem uma irmã. Dora é irmã de Miranda e vocês estão separando duas irmãs.
  De novo, o senhor, como psiquiatra infantil, acha saudável afastar assim duas irmãs? Dora foi levada uma semana antes de Miranda completar 2 anos! Ela nem sabe que Miranda canta, dança, conta histórias. Ela não tem nem uma foto da irmã, pois deixei fotos, roupas, livros com minha amiga Paola Miorim, em Ribeirão Preto e não permitiram que Dora tivesse acesso às suas coisas. Jonas negou-se a falar por telefone com Paola, que só queria encontrá-lo para entregar fotos, livros para Dora.
 O que o senhor acha que pensariam todos os pais que confiaram ao senhor a saúde mental dos seus filhos ao saber o que faz em sua própria casa, com sua própria neta? O senhor não aprendeu errando na educação equivocada do filho Jonas Golfeto? O senhor vai continuar errando até quando? Até quando usará pessoas para experiências psicanalíticas e psiquiátricas?
  O senhor não se envergonha de usar seu título de doutor para repetir que eu preciso de tratamento sem nunca ter me consultado? Isso é ético? Tenho também suas mensagens me indicando tratamento...
  E mais: não é muito triste ter mais de 70 anos e ser conivente com o afastamento de uma criança incrível de sua vida? No próximo dia 9 de fevereiro Dora completará 10 anos. Imagino que irão fazer uma festa de rainha para ela. Será que Dora estará realmente feliz em ter apenas convidados que conhece há um ano? Onde estarão suas amiguinhas do jardim de infância, sua mãe, seus primos, sua irmã, sua vó Laura? Ou a comemoração vai acontecer no dia 10 de fevereiro, quando completa um ano que Dora foi arrancada da escola em Rede Nacional? Com certeza o senhor deve ter muito o que comemorar!
   Ah, sim, o avô Abel já morreu, logo após o Natal. Mas é fato que eu e minha mãe, de 76 anos, ligamos em horários diferentes para tentar falar com Dora, no dia 25 de dezembro, mas o senhor não deixou. Mais uma vez disse que só Jonas poderia autorizar.
  O senhor não se envergonha de afirmar que seu filho que manda? Ora, o senhor sempre o amparou, não só financeiramente, mas em seus delírios também. Até aí é seu filho, tudo bem. Mas Dora... ela tem mãe! O senhor nega a maternidade de Dora, é conivente com o crime de alienação parental. E tem a sorte do apoio da Justiça, sempre tão lenta. Dora irá crescer sem mãe e sem irmã. O senhor matou o passado de Dora.
  O que pensarão seus alunos e colegas do curso de medicina da USP de Ribeirão Preto? Será que concordam com sua total submissão às ordens de seu filho Jonas Golfeto? Não seria a hora de mostrar um pouco de autoridade, pelo bem de Dora? Ou o senhor é submisso ou concorda com tudo isso. Qualquer uma das duas respostas é ruim, mas a última é pior, considerando a profissão escolhida para exercer.
   Seria ótimo ter uma resposta, não só como mãe de Dora, mas como uma cidadã que começa a duvidar da ética de muitas profissões. Se tiver um pouco de dignidade, responda doutor José Hércules Golfeto, responda por esse blog mesmo. Muitas pessoas aguardam uma resposta. Se não responder, o seu silêncio será a resposta afirmativa sobre a crueldade que o senhor sabe que está fazendo. O senhor assume que está traumatizando extremamente sua neta Dora Mendes Golfeto? Como um psiquiatra infantil pode fazer isso?

   Em tempo, a quem interessar possa o endereço do consultório deste psiquiatra infantil é:
   Rua Marquez de Valença, 33, Alto da Boa Vista, Ribeirão Preto, cep: 14025 -010, tel (16) 3911 5917.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Respeito e Liberdade

   Para quem não sabe, Spirit é um longa de animação infantil. É a história de um corcel selvagem, nascido na América do Norte. Do ponto de vista de Spirit acompanhamos a colonização feita pelos ingleses, suas formas de dominar índios e animais. Sentimos a liberdade de viver nas montanhas e correr velozmente entre companheiros de espécie, o respeito com os diferentes e a harmonia com a natureza. Os colonizadores prendem Spirit, que vê seus semelhantes conformados, obedientes. Mas Spirit não se entrega. Prefere perder a vida que a liberdade. Por ser tão corajoso e independente é preso e torturado, tiram-lhe a comida e a água.
   Esse filme vi pela primeira vez em 2005, com Dorinha, que chorou em algumas cenas, mas ficou tão feliz no final que pedia para ver e rever, desejo comum entre as crianças. E agora passo pela mesma experiência com Miranda. Ela ama Spirit em especial e os animais em geral. E de novo me vejo numa situação parecida com a de Spirit. Me tiraram a liberdade de falar com minha própria filha! E a verdade é que a outra parte quer me ver presa. Acho mesmo que o ator Jonas Golfeto não está satisfeito em me separar de minha filha por tanto tempo. Seu objetivo é acabar totalmente com minha liberdade, é me ver presa. Ele não quer nem que eu escreva o que penso e sinto nesse blog! Por que será que a independência e a liberdade incomodam tanto pessoas medíocres e limitadas?
   Só sei que o sistema judiciário colabora com quem não tem pressa. No próximo dia 10 completará um ano que não vejo, nem falo com minha filha Dora. Com total consentimento judicial. Mas alienação parental não é crime? Não parece ser em Ribeirão Preto, onde todos sabem que não me deixam falar com minha filha há quase um ano... e nada acontece! E o que dizer dos avós? José Hércules Golfeto e Ed Melo Golfeto, tão eficientes em alienar. Ela psicóloga, ele psiquiatra infantil. Ambos criaram um alienado e agora alienam minha filha.
   Numa das inúmeras vezes que liguei na residência dos avós, onde minha filha mora, acho que deixaram o telefone fora do gancho, talvez de propósito, então pude ouvir um diálogo esclarecedor. A avó, que tem como hobby preferido fazer compras em shopping center (era seu passeio favorito quando ia para São Paulo "visitar" a neta), chama Dora para ver uma coleção de sapatos  novos! Dora fica extasiada. Escuto seus gritos de felicidade falando das cores e modelos de sapatos. Ela escolhe um e avó fala: "Mas este está tão velhinho!". Nenhum sapato pode ter mais de 10 meses e está velhinho... quais futilidades estarão incutindo na cabeça da minha filha? Dora faz uma combinação e o avô diz que parece uma escola de samba. Dora pede para ir na piscina, falam para ligar para tia Raquel Golfeto. Ela pega o telefone. Escuto sua voz, meu coração vai na boca. Dora diz que está mudo. "Deve ser a mamãe tentando ligar". O avô responde. "Mas ela liga e desliga, não fala nada". Dupla de alienadores mentirosos! Percebam que o pai não está na cena. Podia até estar na casa, provavelmente dormindo ou mergulhado no computador.
     E assim sigo de longe imaginando o que estão fazendo com minha filha. Talvez a transformem numa consumista, mimada e alienada. A pessoa é parte sua genética, mas é muito o ambiente em que é criada. Dora chegou lá uma criatura fantástica, como escreveu o próprio avô num email direcionado a mim. E agora? Como estará Dora?
    Espero que ela lembre de Spirit e não desista nunca de ser livre. No filme, o corcel se deixa dominar por Lakota, o índio que tornou-se seu parceiro na fuga dos colonizadores. Spirit deixa-se dominar por respeito e amizade. Assim como Lakota o deixa ir quando bem queira, porque assim agem as pessoas livres. Não há como se impor respeito, ele vem com a admiração. A imposição traz o medo. E o medo é o sentimento que prosta.
   Só sei que a outra parte, Jonas Golfeto, é muito boa em vingança. Sabe que sou completamente livre e independente. E que me tirar isso é a maior vingança.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

A Morte do Meu Pai

  Foi como uma despedida o dia 25 de dezembro. Quando vi meu pai ainda com um resto de vida, na clínica de repouso onde estava internado há uns 6 meses. Sua pele e seus ossos pesavam pouco mais de 30 kg, seus olhos já não pareciam enxergar. A degeneração provocada pelo Mal de Alzheimer é tão fatal, que a morte parece ser a melhor e a única solução. Por enquanto não tem cura, nem salvação. Chorei ao ver meu pai assim na cama, no dia de Natal. Mas chorei muito mais, por mais de 5 dias e noites quando sua pena de morte foi decretada com o diagnóstico de Alzheimer, em 2006, já em estágio avançado.
  Ele ainda tinha alguma noção e algumas lembranças cristalizadas. Às vezes ficava pensativo e me dizia em tom e expressão de indignado:"Quer dizer que vou morrer de Alzheimer?". Sim pai, se você não tiver a sorte de uma intercorrência no caminho, respondia sabendo que depois ele não lembraria. Um dia ainda chegou a dizer que jamais esqueceria de mim. Mas eu não fiz questão de estimular sua memória, já que estava ocupada demais em um processo insano de guarda.
   Uma das coisas que a doença do meu pai me ensinou (pois com tudo se aprende) é que não devemos nunca idealizar o futuro ou planejar a velhice. Que a única coisa que importa e existe é o presente, por mais duro que ele possa parecer. É o que temos de fato. Ficar chorando e lamentando o trágico destino ou partir para outro presente (que sempre existe, nem que seja em um universo paralelo) daí é uma escolha. Aprendi também que existem dois tipos de sofrimento: o inevitável e o provocado. No primeiro incluem-se doenças desenvolvidas e de propensão genética, como o Alzheimer. O segundo sofrimento é o que é imposto, como o da ação na Vara de Família. Dora nem precisava, mas já sabe o que é sofrimento causado pelo outro. Quando ela duvidar tenho um email do pai dela, de agosto de 2005. Eu imploro perdão pelo não sei o que fiz. Escrevo linhas e linhas de mea culpa (sem ter culpa de nada). A resposta do pai amoroso? "O processo em vara de família será longo e doloroso para nós três". Seco, duro, ríspido... e daí que vai colocar a filha para sofrer durante toda a infância? Ele sofrendo? Duvido. Ainda não entendo o motivo, mas a razão é me fazer sofrer. Apenas e tão somente isso, mesquinho assim mesmo. Vingança pura.

Enfim, se foi o homem que mais me amou (talvez o único)

  E na manhã do dia 27 de dezembro, o sofrimento do meu pai cessou. Eu estava tão preparada para sua morte, que não sofri, já estava desapegada da presença dele, que há algum tempo era só física... e nem parecia mais o grande Abel Correia Mendes. Meu pai mesmo comecei a perder há mais de 10 anos.
  E então fui ao IML, até a funerária, no cemitério... todas essas funções fúnebres de forma tranquila, em companhia do meu primo Oswaldo Gonçalves Junior (impressionante como algumas pessoas estão presentes em momentos decisivos das nossas vidas). Ser filha única tem dessas coisas, sempre soube, caso a vida seguisse o rumo esperado, que caberia a mim somente enterrar meus pais. Pensei que seria mais tarde, ainda mais meu pai, que sempre projetou ser um velhinho aventureiro, cheio de energia, disposição e vontade de continuar desbravando o mundo. Na sua última década de vida manteve-se a mercê de outras vontades, sem ser dono de sua própria vida ou destino.
  E no enterro, com parentes e alguns amigos que nem sabiam o estado crítico em que ele se encontrava, vi seu semblante sereno, deitado no caixão com flores. Miranda pensou que o vovô estivesse dormindo. Nunca entendi o amor incondicional de Miranda pelo avô, já que ele nunca nem a pegou no colo, já muito debilitado quando ela nasceu. Miranda mal ouviu sua voz, viu o avô andando com dificuldade, depois numa cadeira de rodas, mas como amava esse avô! Quando viu seu caixão indo terra abaixo começou a chorar, pois queria ver o vovô. Daí a levei para ver a cova. "É aí que o vovô vai ficar?". Sim, o corpo do vovô Abel vai ficar aí agora. "Tá bom" e parou de chorar. Tão simples o entendimento infantil. Em nenhum momento mencionei a palavra morte.
  E uma das amigas dos meus pais, não lembro bem quem, me perguntou: "Não deixaram a Dora vir nem no enterro do avô?". Respondi que não deixaram nem falar com a mãe por telefone no dia de Natal, porque deixariam viajar para o enterro do avô? Duvido até que a deixassem vir para o enterro da mãe. Aliás, isso só seria possível com ordem judicial, o que, com carta precatória, mais o recesso do judiciário (que só volta dia 9 de janeiro), mais as vistas do promotor, do juiz, o argumento da outra parte (para não permitir)... enfim, com sorte, Dora poderia estar aqui na missa de um ano da morte do avô. E, provavelmente, ficará sabendo da morte dele agora, se a família que lê avidamente esse blog, resolver contar, ou no dia que eu, finalmente, encontrar minha filha. Ou por oficial de Justiça.
    Sabe o que mais dói? A omissão do sistema judiciário. No Fórum de Ribeirão Preto estão todos carecas de saber que a família de Jonas Melo Golfeto não permite sequer contato telefônico com minha filha. Essa sordidez passou dos limites, no próximo mês completa um ano que minha filha foi levada, com busca e apreensão de menor, devidamente filmada pela equipe de foquinhas do Profissão Repórter. Que nome pode-se dar a isso que não seja Alienação Parental? Isso não é crime? Então o sistema judiciário corrobora com um crime. Quem vai pagar por esse crime? Por que uma família que ama tanto a Dora  lhe impõe esse sofrimento? Fazê-la feliz com coleções de sapatos e roupas novas é fácil. Felicidade efêmera e superficial. Difícil é ter nobreza de espírito. Difícil é ensinar ética, moral, generosidade e confiança. E no fim, como já havia postado no Desencanto de Natal, os protagonistas desta história estarão todos mortos em 100 anos. Por que tudo isso mesmo?
   Como já dizia Borges (o escritor argentino): "Não existe perdão, não existe vingança. O esquecimento é único perdão e a única vingança". Então, se eu tiver os 20% a 40% de chances de desenvolver Alzheimer (dura estatística para os filhos e parentes diretos), será uma forma de esquecimento. Porque algumas marcas são tão fortes e profundas, que não há como perdoar, muito menos esquecer.