quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Aprendendo com Criminal Minds

    Quem me conhece sabe o quanto gosto de séries e filmes sobre investigações criminais. Até quem não me conhece, mas lê o que escrevo, pode perceber isso. Mas Criminal Minds, em especial, me inspira muito. Devo confessar: a primeira vez em que parei no canal AXN foi porque vi um homem lindo, de corpo esculpido em mármore negro, trajando roupas de praia. Era o ex-modelo e ator Shemar Moore (Derek Morgan*), no último episódio da primeira temporada. A visão desse deus do Olimpo me fez parar no canal... nos idos de 2007. Mas a trama me prendeu de um jeito, que passei a assistir sempre que lembrava, até me tornar fã da série e não querer perder nenhum episódio e rever sempre que possível. Até porque sempre há uma citação literária em cada episódio, afinal, todos os personagens gostam muito de literatura e estão sempre lendo algum livro.

    Trata-se de uma equipe de agentes do FBI, especializada em traçar perfis de criminosos psicopatas e seriais. Isso porque os psicopatas enganam muito bem, parecem pessoas "normais", geralmente trabalham e tem família, por isso policiais e agentes federais comuns não conseguem identificá-los. Nem todos os psicopatas tornam-se assassinos seriais, mas todos conseguem destruir vidas, sentimentos e muitos vivem normalmente em sociedade. Criminal  Minds utiliza casos que realmente acontecem nos EUA e que assustam, justamente por serem baseados em assassinos reais. Os monstros existem e podem ser seus vizinhos, amigos, pais, filhos.
      Além de ser didático, mostra uma equipe altamente especializada, profissional e que forma uma família, talvez esse seja o ingrediente de sucesso da série, a humanização desses agentes. Derek Morgan é macho alpha, mas sofreu abuso sexual de um treinador, quando era adolescente e vivia no gueto. Não acredita em Deus e foge de igrejas. Isso torna sua massa muscular invejável em um ser humano frágil e carente. Como sou um pouco obsessiva com informações sobre o que me interessa  (ou nem tanto), fiquei sabendo que Shemar Moore é a combinação genética de mãe holandesa e pai africano. Também foi ciclista e quando sua mãe foi diagnosticada com esclerose múltipla, convenceu todo o elenco do CM a fazer um passeio ciclístico pelo País, conscientizando a população sobre a doença e a importância do seu diagnóstico precoce. A liderança do personagem também está no ator.
     Poderia escrever um tratado sobre a série, comentando sobre cada personagem, fazendo sempre uma analogia com minha vida ou de pessoas que conheço. Mas prefiro me concentrar em Derek e o dr Spencer Reid (Mathew Gray Gubler). Reid é um jovem gênio (do jeito que eu gosto), médico psiquiatra, também filósofo, atormentado pelo medo que a esquizofrenia da mãe (também uma médica genial) tenha peso em seu DNA. Um personagem tão apaixonante quanto o ator. Nem precisei fazer pesquisa sobre ele, minha amiga/irmã/camarada Marcia Abad*, fez isso por mim. Mathew Gray Gubler tem uma das vozes mais deliciosas de se ouvir (Paulo Miklos/Titãs é outro) e tem um site onde mostra seus desenhos e vídeos, enquanto lê contos de Edgard Alan Poe. Também é ex-modelo. Fico sempre feliz quando descubro que os atores são maravilhosos como os personagens. Penso que o verdadeiro artista, além do talento, precisa ser sensível e generoso, porque assim é arte!
      Gubler também dirigiu um episódio que me fez chorar (será grave chorar assistindo Criminal Minds?). Era sobre uma mãe que teve o filho desaparecido há 9 anos e sempre que sabia de um desaparecimento de criança nas mesmas circunstâncias, procurava a equipe para dizer que poderia ser o mesmo serial killer. Essa mulher acabou com seu casamento e perdeu a guarda da filha menor, por viver nessa "paranoia" de querer encontrar o filho, que todos já davam como morto. Também começou a beber, mas nunca desistiu de procurar o filho, nem que fosse a procura por seus restos mortais. 
      Eis que 9 anos depois, realmente o filho estava vivo, nas  mãos de um casal de psicopatas, que sequestrava e torturava criancinhas. O menino agora era um adolescente, que ajudou a sequestrar algumas dessas crianças, como meio de sobrevivência. Foi o único que viveu tanto tempo, os outros já estavam mortos. Apenas 2 crianças são encontradas com vida. A mãe que era tirada de louca abraça o filho loucamente, após 9 anos. O pai que desistiu, que ficou com a guarda da filha, também chora. A mãe pergunta ao dr Reid o que fazer para recuperar o filho. "Com a mãe que ele tem, que nunca desistiu e sempre acreditou, ele vai superar tudo isso". Daí eu também chorei.


* Derek é o macho alpha, líder nato, que toma a iniciativa imediata quando não há tempo a perder.
* Marcia Abad é uma amiga que gosta dos mesmo filmes, livros, músicas e seriados que eu, além de ser uma engenheira, especializada na área de saúde (!). Muitas vezes vou contar algo como novidade absoluta e ela me apresenta mais "n" novidades sobre o mesmo assunto. Agradeço muito por sua amizade e conhecimento.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Mais um Dia dos Pais Superado

    Como bem lembrou meu amigo Clayton Martin, é só uma data comercial, feita para vender, assim como Dia das Mães e das Crianças (agora também tia dia da Avó, afinal a expectativa de vida aumentou muito na última década). Também não gosto de homenagens póstumas... Mas foram tantas declarações que precisei escrever. Fiz uma postagem no tal facebook, que rendeu muitos comentárias e que me deixou muito feliz, porque meu pai não era só bom para mim, mas para muita gente. Chorei quando li minha amiga/irmã Rosane Mendes "por muitos anos, seu pai também foi meu pai".  
    Dia dos Pais para mim, há muito tempo, é uma data triste. Não tenho mais meu pai, o pai de minha filha a levou embora e há 3 anos não sei nem o que é Dia das Mães com ela. E Miranda não tem pai, o genitor primeiro negou, depois não compareceu em audiência, nem em teste de DNA, depois não foi encontrado e nunca procurou por ela. Mas Miranda é tão impetuosa e destemida que talvez nem precise da figura forte de um homem para protegê-la. Tem a mamãe aqui, que também é muito forte e destemida. Mesmo assim é triste, pois ela vê propagandas, fotos e preparativos na escola. O mundo consumista não pensa nos bilhões sem pai ou mãe. Enfim... 

     "Não perdi meu pai no dia de sua morte. Comecei a perdê-lo 10 anos antes, quando seu cérebro brilhante foi atacado pelo Alzheimer... E eu demorei para perceber e passei noites chorando por tudo que viria acontecer. Me sinto incompetente porque os genitores de minhas filhas não chegam aos calos dos pés de meu pai. Não dá para imaginar o Abel arrancando a filha da mãe, ao contrário, sempre apaziguava nossos desentendimentos constantes. Sapateava para driblar o conservadorismo materno com a independência e liberdade da filha. Não imagino meu pai tendo uma filha e não reconhecê-la ou ampará-la, por mais que tenha sido o encontro de uma noite. Meu pai amparava os filhos dos outros!
    Sou a mãe que posso ser, mas tento ser para Miranda o pai que eu tive. O que leva na escola, faz lição de casa, torce, viaja para lugares distantes e selvagens, briga, grita, xinga e pede desculpas e diz sempre que ama. Dele herdei duas paixões que me definem: natação e literatura. Queria ter dito muito mais vezes o quanto eu o amava. E se dele tiver também a herança genética do Alzheimer será esperado e até merecido. Assim poderei esquecer as pessoas ruins que arruinaram minha vida (e que tiveram a sorte de eu já ter um pai doente), poderei me perder aos poucos e dar valor ao que realmente é necessário... Ah! Ele também era lindo e nem precisava!"

    Foi esse o texto que escrevi e despertou citações e muitas saudades. Repito o mesmo texto aqui, porque muitos leitores não fazem parte dos meus amigos de redes sociais (até porque tem leitores em todos os continentes e me orgulho muito por isso). Me emociona tanto saber que meu pai é lembrado sempre como a pessoa que eu acredito que ele foi. Muitas vezes fantasiamos um herói ou vemos um antagonista na figura paterna. Eu via um companheiro, um feminista, liberal. Agora eu sei que o valor que via nele era real. Com todo seu jeito explosivo, porém conciliador, com seu sorriso e olhar maroto/santista, como comentou meu querido Sérgio Duran (uma pai maravilhoso, diga-se de passagem). E quando eu escrevi que certas pessoas deram sorte por meu pai estar doente, quis dizer que, se estivesse são mentalmente, jamais deixaria um litígio acabar com minha vida, me afastar de minha filha. Primeiro que ele pagaria todos os advogados necessários, se não conseguisse antes convencer as partes com sua lábia fenomenal, pois Abel Correia Mendes, se não vencesse pelo argumento, ia mesmo pelo cansaço.
    Mas só fiquei sabendo após sua morte sobre uma atitude linda, encantadora. Quando eu tinha 16 anos namorava Danglares Silva, um jogador de vôlei de 19 anos, lindo, inteligente, fazia faculdade de Educação Física, gostava das mesmas músicas e filmes que eu, adorava esportes, enfim, um daqueles príncipes que sempre aparecem na adolescência. Certa vez voltávamos dos nossos respectivos treinos pela orla da praia da Enseada, no Guarujá, o ano era 1986, tudo muito deserto. Paramos num banco para conversar, namorar e ver o mar. Como nunca nos faltou assunto, nem percebemos que já passava das 21 horas e eu nunca chegava do treino depois das 19h30 (e sempre ligava para não deixar ninguém preocupado). Então vejo o carro de meu pai se aproximando. Ele parou com cara de contrariado, falou que era um perigo nós ali sozinhos, com o tanto de bandido que tem nas ruas. Me levou para casa primeiro, depois levou o Dan até a "república" que ele dividia com outros atletas.
   
    Só 25 anos depois o Dan me contou a conversa que teve com meu pai. Não cabe aqui todo o diálogo, mas o pedido de meu pai; "Eu só te peço uma coisa, Dan, faça a minha filha feliz". Quando soube disso, chorei como a menina que vai mal na prova. Meu pai era ainda maior do que eu imaginava.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

O Masoquismo que Me Deu Resistência

    Na última segunda-feira, perto da meia-noite, enquanto esperava o ônibus na rodoviária de Ribeirão Preto para voltar para Santos, recebi uma mensagem do escritor/filósofo Paulo Ghiraldelli para ler uma matéria, antes de ver o filme. Curioso, pois não nos conhecemos, apenas somos adicionados numa tal rede social chamada facebook. Não sei o que ele sabe de mim, dos meus interesses filosóficos ou da minha humilhação constante. Mas li, claro! Era sobre o filme que está para ser lançado, a história da filósofa alemã, de origem judaica, Hannah Arendt. Essa mulher filosofou sobre a humilhação. Na matéria tinha um trecho assim:

"O que é realmente humilhante? Morrer como um inseto, mas se sabendo um inseto. Isso é humilhante. Mas morrer como um inseto, reconhecendo-se inseto e sob as botas de um idiota que o derrotou, isso sim é humilhante para valer. O que Hannah Arendt fez com os judeus logo após o julgamento de Eichmann foi humilhar os judeus ainda mais que isso. O que ela fez foi contar ao mundo que eles haviam sido mortos como insetos nas botas de um vencedor que não era um monstro ou um demônio, mas simplesmente um simplório, um medíocre qualquer, um idiota.
Isso quase a transformou em uma partidária do antissemitismo aos olhos da comunidade judaica de Nova York. Até seus amigos mais queridos, lá em Israel, lhe viraram o rosto. Como já havia acontecido em Atenas e, depois, em tantos outros lugares, o filósofo não foi entendido e teve de pagar um preço alto pela burrice alheia e pela sua necessária ingenuidade. Afinal, um filósofo não ingênuo não seria filósofo."

    Então me senti o inseto massacrado por um medíocre qualquer, um idiota, que assim como Hitler, conseguiu apoio de poderosos. São 7 horas de viagem de Santos para Ribeirão Preto, depois de Ribeirão Preto para Santos, para ficar durante 2h30 com minha filha, na sala cinza e fria de um Fórum, monitorada por uma psicóloga. É muito humilhante, mas é o que eu tenho para manter viva a minha lembrança para minha filha, para que eu possa levar fotos em que ela reconheça seus amigos e a vida que lhe foi arrancada. É humilhante para nós duas, mas ainda mais para mim, julgada o tempo todo, sinto os olhares curiosos e críticos de todas as mulheres que passam por nós naquela sala. Isso é ainda pior. São mulheres, todas mulheres. Sinto o machismo em muitas mulheres, em amigas traídas que culpam a outra mulher pela traição. Ora, a outra mulher não a conhece, seu marido que traiu, sim. Vejo o machismo feminino quando toleram o pai que não reconheceu a paternidade e zombam de mães solteiras. Sinto o machismo quando escuto :"se perdeu a guarda, não é flor que se cheire". Não, já fui flor que se cheire, hoje sou a que espeta! Já espalhei pétalas, hoje junto os cacos.
    Vencida pelas lágrimas, pelo incômodo nas costas de ficar duas noites seguidas sentada em um ônibus, procurei ler algo que me alegrasse, fui no blog Epichurus, do nadador Renato Cordani. Talvez ele não lembre, mas nos conhecemos em 1985, no aeroporto de Miami, onde ficamos por 8 horas esperando passar o Furacão Helena, sentamos juntos no avião e ele parecia um dos caras dos Beastie Boys, aliás, sempre acho os nadadores adolescentes parecidos com os caras do Beastie Boys. Esse blog é muito específico para nadadores, anárquico e democrático, abre espaço para que outros escrevam textos nele também. São textos divertidos, explicativos, deliciosos de se ler.
     Li o post de outro nadador, muito querido, Rodrigo Munhoz, sobre o masoquismo de nadar 400 medley, a prova mais dolorosa da natação. Acho mesmo que atletas são masoquistas, porque é muito bom sentir a dor pós-treino. Mas a natação, principalmente aquela dos tempos em que nem todas as piscinas eram aquecidas, é o mais masoquista dos esportes. Daí fui fazendo uma viagem no tempo, além da literal, que doía as costas. Por que nadei tanto? Tantas viagens, por horas dentro de ônibus lotado de atletas cantando, perturbando, não deixando dormir... talvez, só talvez, isso tenha sido um preparo para tantas horas semanais dentro de um ônibus, talvez aqueles treinos inesquecíveis, como os 15x50m para 45", pagando no final os "tiros" em que eu passava de "45, ouvindo meus melhores amigos tirando sarro, enquanto eu tirava as lágrimas dos oclinhos, tenham sido uma preparação para tudo o que estava por vir: dor, humilhação e muita resistência.
   Lembro dos treinos quase desumanos do Ênio Faria, como os 100x100m, para 1´40"! Isso mesmo, 10 km nadados de forma completamente tediosa, cansativa... quantas vezes eu pensava em sair da piscina e ir para o chuveiro quente? Mas nunca ia, eu continuava e não sabia porque continuava, mas para mim, missão dada é sempre missão cumprida. De alguma forma era um preparo. Por algum motivo fui cair nesse blog de nadadores para me lembrar de tudo isso e também lembrar que demorei para conhecer o machismo, porque mesmo sendo um lugar dominado por homens nunca fui criticada por estar peluda, porque não dá para estar sempre depilada e nós deixávamos isso para os finais de semana, assim como os garotos se raspavam inteiros e ninguém tinha nada a ver com isso. Jogávamos futebol, vôlei e basquete nas horas vagas e nunca ouvi "isso é coisa de homem", as meninas mais "namoradeiras" eram até admiradas, porque encontravam tempo para isso, não criticadas, meus namorados nadadores nunca reclamaram por eu ter a maioria de amigos homens, nem se importavam se eu dormia em casa de amigos ou viajava com amigos.
    Tem que haver um sentido para tudo isso e talvez eu não estivesse aguentando tudo se não tivesse sido tão masoquista quando nadava. Obrigada técnicos carrascos! Obrigada amigos nadadores feministas, obrigada pai por ter me obrigado a fazer natação!
    Outra curiosidade é que a natação sempre está ligada com o rock, a maioria coloca uma música na cabeça para dar ritmo e não enlouquecer com o barulho repetitivo da água nos ouvidos, então tenho muitas amigas de infância totalmente rockeiras e nunca sofremos preconceito por isso. Rock sempre foi coisa de gente, nunca coisa de homem. Hoje vejo como muitas músicas de amor cabem perfeitamente no meu amor maternal, o maior amor do mundo.

Obrigada Julian Casablancas por dar melodia e voz para o que sinto!