O tema “adoção” sempre me
interessou, desde criança, quando houve uma oportunidade de meus pais
adotarem um menino. Não lembro ao certo porque isso não
aconteceu, sinto falta desse irmão que nunca tive. Por conta desse meu interesse acabei
levantando muitas pautas sobre adoção e fazendo várias matérias sobre o assunto.
Uma delas foi na Folha da Tarde, não queria fazer mais do mesmo no Dia das Mães,
então sugeri uma entrevista com um grande amigo meu, adotado na tenra infância.
A mãe dele ficou muito emocionada com a homenagem e ele feliz por de alguma
forma retribuir o ato de amor.
Outra que me marcou muito sobre um casal de
advogados, no Grande ABC Paulista. Os
dois entraram em um processo de adoção para um casal de clientes, ficaram anos para conseguir a criança do jeito que o casal queria,
enfim chegou a criança, um pouco mais velha do que o desejado, mas um mês depois, no período de adaptação, o
casal “devolveu” a mesma. Os advogados, pais de uma única filha,
pré-adolescente, já tão envolvidos na história, encantados com a criança órfã e
decepcionados com a atitude desumana de seus clientes, não pensaram duas vezes
e adotaram a criança, abandonada pela segunda vez. Quando eu os entrevistei
tinham 6 filhos adotivos! Quanto mais amor eles davam, mais tinham.
O grande problema
é que a maioria esmagadora dos casais brasileiros procura uma menina branca
recém-nascida. Primeiro porque acham que meninos são mais difíceis e podem
virar bandidos, segundo porque a criança negra pode ser confundida como filha
da empregada. Naquela época (anos 90) os meninos negros acima de três anos
atingiam a maioridade nos abrigos. Atualmente há mais de 5.400 crianças esperando uma família e mais de 30 mil casais na fila de adoção. Essa matemática está muito errada!
Vi uma matéria na TV Cultura em que uma
menina branca, de 3 meses, acabava de ser adotada. A mãe biológica a abandonou
na maternidade. Os pais adotivos ficaram imensamente felizes, após 6 anos de
espera, porque enfim chegou uma menina
branca, saudável, do jeito que tanto queriam.
Com a nova resolução do Conselho
Nacional de Justiça, integrando casais estrangeiros e brasileiros que moram no
exterior no Cadastro Único de Adoção, espero que esse quadro mude. Os europeus
loiros de olhos azuis não se importam de ter meninos negros com mais de 7 anos.
O desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Antônio Carlos Malheiros, na mesma matéria, contou a história de um casal de noruegueses, brancos como a neve, de cabelos
cor de palha, que adotou 3 irmãos negros, de 10, 8 e 6 anos. Quando foi
levá-los até o aeroporto, fez uma pergunta: “Como vocês vão fazer para lidar
com a diferença?”. “Qual diferença?”, foi a resposta interrogativa. Mas todos
nós sabemos que o Brasil não é racista...
O mesmo desembargador concorda que é
preciso uma reforma nas Varas de Família, que faltam psicólogos e assistentes
sociais, fundamentais para agilizar os processos. Concorda também que a
infância passa rápido, que o tempo das crianças é diferente e que essa fase da
vida é um referencial para todo o resto. Mas o que eu mais queria perguntar
para esse desembargador é que, sabendo de tudo isso, por que esse sistema não
muda? Por que com tantas crianças órfãs de fato, a Justiça mantém outras
crianças órfãs (do pai ou da mãe) em litígios de disputas de guarda que demoram
10 anos? O meu processo já encerrou, a guarda definitiva é do pai (embora todos
falem que a guarda pode ser mudada a qualquer tempo). Mas não ter a guarda não
é o mesmo de não ter direito de convívio.
A infância passa rápido, minha filha
nem é mais criança. O afastamento é um fato. A ruptura foi constatada até pela
psicóloga forense, mas nem isso faz com que a Justiça acelere. “Ah, agora está
adaptada aqui, não vamos mudar mais nada. De repente se for passar férias com a
mãe vai ficar confusa”, deve pensar essa gente (juiz e promotor) que nunca viu
a cara da minha filha.
Na minha singela opinião de quem vive há 9 anos em
fóruns, perícias e delegacias fazendo boletins de ocorrência, os cargos de
promotores e juízes não deveriam ser concursados. Uma vez concursados ficam lá
para sempre o na pior das possibilidades recebem aposentadoria compulsória. Não
importa o quanto demorem ou errem, seus gordos salários nunca deixam de cair em
suas contas. Se fossem eleitos de 4 em 4 anos, a situação seria totalmente
outra. Imaginem um juiz (no meu caso 4!) que demora mais de 3 anos apenas para
conceder o direito de visita para uma mãe? Com certeza esse senhor de toga teria
seu nome na Corregedoria, haveria campanha contra e não se reelegeria. Com
certeza seria mais rápido, exigiria mais assistentes sociais e psicólogos,
exigiria agilidade de todos ao seu redor.
Mesmo sendo funcionários públicos,
uma vez lá, não importa o público, importam seus interesses privados, seus
conhecimentos e trocas de favores. A criança na Vara de Família é o que menos
importa, afinal o tempo passa rápido e ela cresce e deixa de ser criança.
Ainda quero muito realizar meu sonho de ser mãe adotiva e como minha situação judicial e financeira não ajuda,
talvez só realize esse sonho depois dos 50. Não terei nenhuma exigência, de
cor, de sexo, de idade, aliás, se tiver mais idade, melhor. Só quero olhar nos olhos
de uma criança que nunca teve mãe e sentir aquele amor que bate e volta. O amor
pelo ser que é humano. A hora da adoção é uma das poucas em que mulheres levam
vantagem sobre os homens, mas tem que ser branca e recém-nascida.