quinta-feira, 24 de julho de 2014

A Sentença

    Nem esperava mais ver minha filha neste ano. Não por faltar esperança, mas por estar dentro da roda viva (ou morta) do sistema judiciário brasileiro. Explico: meu processo estava no gabinete do juiz desde 24 de abril para ser julgado, mas havia outros desde janeiro lá, que não foram "apreciados". Junte-se a isso ano de Copa do Mundo. Para quem não sabe em dia de jogo do Brasil os fóruns de todo o País só funcionaram até meio-dia. E juiz só trabalha a partir das 13h. Logo, por seis dias nenhum juiz do Brasil participou de audiências ou julgou qualquer coisa. Não, nenhum deles precisa repor esses dias. Depois tem eleição em outubro e novembro. As coisas também empacam mais ainda no Judiciário.
    Então preparei minha filha de que não nos veríamos neste ano. Ela ainda pediu para eu pedir visita de novo na sala do Fórum de Ribeirão Preto. Mas expliquei que, para isso, seria necessário tirar o processo do gabinete do juiz e depois voltava para o fim da fila. Então minha filha me escreveu:" daí demora mais, né? Sim, filha, daí nem em 2015". E parei de falar de processo porque ela não quer saber disso. Ninguém mais quer. Ninguém mais aguenta. 
    Daí dei sequência em um projeto em que passaria até o final do ano (ou até quando o juiz resolvesse dar uma sentença) no Assentamento Terra Vista, em Arataca- BA. Seria uma experiência incrível para mim e para Miranda morar em um assentamento do MST (Movimento Sem Terra)! E lá também iria escrevendo um outro projeto de livro, o qual detalharei em outro post.
     Mas eis que no dia 26 de junho, em plena Copa do Mundo, contrariando toda a falta de expectativas, tudo mudou. Saiu uma sentença! Nela o juiz decide que poderei ver minha filha em Ribeirão Preto de 15 em 15 dias. Aos sábados das 14h às 19h e aos domingos das 10h às 16h. Sempre assistidas por alguém que a outra parte indique. Sentenciou também que terei de fazer terapia (a louca) com psicólogo e apresentar relatório no final do ano. Se tudo correr bem, a partir de 2015 poderei pegar Dora aos sábados 14h e devolver domingo, 16h.
     Dessa forma estaremos sempre, invariavelmente, na casa da minha amada amiga Paola. Não sei se o juiz sabe que tenho essa amiga de infância lá, se pensa que fico em hotel ou espera que eu mude para Ribeirão Preto. Esperei longos 3 anos e 4 meses para ter essa sentença... me sinto muito derrotada em nunca mais poder trazer Dora para Santos, para ver os amigos... mas é melhor do que uma sala no fórum por 2h30, só na segunda-feira, com psicóloga monitorando.
      Fiquei sem saber o que fazer após essa sentença, essa é a verdade. Perguntei para Dora se soube sobre as visitas. Disse que sim, mas não quis prosseguir, imagino que não saiba muito ou que não tenha achado tão bom assim também. Enfim, aproveitei que já estava preparada para ir para a Bahia e fui para lá com Miranda e o que aconteceu em Arataca (onde fica o Terra Vista) e depois em Brasília, onde passei 4 dias, é assunto aí para mais uns dois posts.

     Como o juiz deu 15 dias para a outra parte dar o nome da pessoa indicada e já passou mais do que isso e nada foi colocado, imaginei que minha indicação, a amiga Paola Miorim, estaria valendo. Já que estava em Brasília, pensei em pegar um vôo de lá para Ribeirão Preto que é mais perto, imaginando que no próximo final de semana eu teria um passeio mais decente com Dora. Sei lá, um parque, ar livre, sol, almoço na casa de Paola, preparado por nós todas: eu, Paola, suas filhas Lívia e Giovana, eu, Miranda, Dora e a pessoa que seu pai indicasse, que com certeza acabaria simpatizando comigo e com minhas amigas. Mas nada de respostas, nem de minha advogada, que ficou doente.
     Resolvi perguntar direto para a fonte. Estava no facebook (meu contato mais frequente com minha filha) e lhe pedi para perguntar para seu pai se teria visita. Rapidamente me respondeu "meu pai disse que não vai ter visita nesse final de semana". Bom, ao mesmo tempo que a resposta definiu meu roteiro de viagem, me deixou numa angústia irritante. A impressão é que o processo é todo dominado pela outra parte. Ele meio que manda em tudo no processo. Deve pagar muito bem a advogada... já eu tenho até pena da minha, que fica até doente e não recebe nada de mim, só uma gratidão tosca. Acabo ficando tão estressada com tudo e quase todos e, como ela é a única pessoa que pode me ajudar, acho que atrapalho cobrando respostas.
     Mas enfim voltei e nada de data da visita, mesmo com sentença. E não sei se mudo para Ribeirão Preto logo de uma vez. E me sinto perdida. Daí fiquei ouvindo muitas músicas e parei nessa http://youtu.be/RQ-6BXsaDD0. Mas não posso me sentir como uma música dos Smiths. 
     Então pensei nos dias lindos que passei em lugares distantes da Bahia. Depois na ensolarada Brasília, com muita gente alternativa e linda e pensei que a vida é muito mais que um processo. Me resta esperar. Vou continuar esperando da forma mais suave possível.. E essa música linda de amor é para minha filha Dora, que amo tanto e que nem toda a distância, tempo, burocracia e gente escrota do mundo será capaz de diminuir ou estancar esse sentimento. Nada melhor do que um ataque de fofura com Fernanda Takai e Samuel Rosa para curar essa dor http://youtu.be/OprMsRlHFBE .

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Mis Hermanos Argentinos

    Meu primeiro contato com argentinos foi aos 16 anos, quando fui para uma competição no Clube San Fernando. Não sabia falar nada de espanhol e fiquei uma semana na casa de atletas. Eram 3 nadadores: Pablo, 16 anos, Florência, 14, Natália, 10. Fui tratada como filha e irmã. Os pais me disseram que poderia abrir a geladeira quando quisesse e comi uma caixa inteira de alfajor (não conhecia essa delícia), depois me deram duas caixas para levar para o Brasil, uma para mim e outra para meus pais. Chorei na despedida de tanta saudade antecipada. Alguns meses depois recebi Florência em casa e também Gabriela, que era recordista sul-americana de 800m nado livre (um luxo e uma das minhas provas preferidas na época) e nada tinha de arrogante por isso, ao contrário, era muito divertida e incentivava outros nadadores sempre.
   Algum tempo depois minha prima e grande amiga Keila, uma "parabólica" de argentinos, namorou Max. Depois conheceu um argentino guitarrista gato e eu acabei namorando Diego, o baterista da banda, que era lindo, inteligente e apaixonado, tinha 21 anos e eu 23. Quando levei Diego para passar um final de semana em Paúba (litoral norte de SP), com amigos brasileiros, alguns falaram: "Pô, namorar argentino?". Depois de algumas horas, Diego já era amigo de todo mundo, muito divertido e cheio de charme. Um tempo depois Keila conheceu Guadalupe Bárcena e Ximena Spina, que se tornaram minhas grandes amigas.
      A primeira vez que fui para Búzios (RJ) fiquei na casa de Marcela Ferioli e ela nem estava em casa.  Fiquei lá com o pessoal da banda Nova Semente, e as filhas de Marcela que estavam com o pai e a boadrasta argentina Gabriela Klet (pessoa linda, de quem me tornei muito amiga). Dois anos depois morei em Paraty e Marcela, seu companheiro Sebastina e suas filhas Raiz e Alice mudaram para lá. Nos tornamos as melhores amigas. Seu caçula Leon foi gerado na mesma semana que Miranda e eles tem cinco dias de diferença! Com Marcela voltei a fazer yoga e fizemos vários programas de grávida juntas.

   Tudo isso para dizer que há quase três décadas convivo com hermanos, conheço sua cultura, seus talentos, suas características, seus defeitos. Admiro como são politizados, independentemente da classe social, como gostam de literatura e música. Assisti todos os jogos da Argentina na Copa do Mundo e vi uma equipe que ia se acertando e melhorando a cada jogo. Não escrevi durante a Copa porque não me envolvi muito, admito que torci para o Chile vencer o Brasil nos penaltys, e que assisti ao jogo com camiseta do Brasil e agasalho do Chile (um pedaço do meu coração mora lá). Sabia que se passasse do Chile e Colômbia, os "canarinhos" tomariam uma lavada da Alemanha. Tudo bem que a minha lavada era de 3x0, mesmo tão realista não esperava a goleada histórica. Mas no final os 7x1 foi pouco. Foi evidente que os alemães se controlaram para não fazer mais gol. Eu torcia mesmo era para Neymar e assim que ele foi lesionado perdi a vontade de ver jogo da Seleção. 
    Desde as oitavas de final eu pedia para ver jogo da Argentina na casa de Ximena e seu companheiro Sebastian Madruga, com os filhos Axé, Leon e Joakin. Mas nunca dava certo a combinação, até que fui lá na semifinal com Miranda (que se considera prima dos meninos e adora dizer que é Argentina). Ximena achava que eu não poderia ir porque só os que viram desde o começo juntos deveriam seguir assim até o final. Já "Sebá" observava que uma brasileira torcendo sinceramente para a Argentina só poderia trazer sorte. E foi assim que assisti o excelente e emocionante jogo Holanda e Argentina. Nos penaltys eu torci em pé e pulei abraçada com meus hermanos.
    Um dia antes da final minha mãe fez uma reunião para comemorar seus 79 anos. Fiquei muito feliz ao ver que vários primos iriam torcer para os hermanos. Assim como minha mãe, que gosta demais de Ximena e Guadalupe. Mas fiquei completamente irritada com outros parentes que só falavam mal dos argentinos como povo, chamando-os de racistas e arrogantes. Gente que não conhece argentino e nunca esteve no País. Gente que se deixa manipular pela mídia que incentiva esse quase ódio contra os argentinos. O que vi nas redes sociais foi um absurdo de torcida contra, de palavras de xenofobia. Chegaram a me mandar morar na Argentina já que gosto tanto deles! E olha que moraria em Buenos Aires fácil...
     Na derrota cheia de garra e luta para a Alemanha, fiquei tão triste que Ximena acabou me consolando: "Jogamos bem, fomos vencedores, nem esperava ir tão longe, é só um jogo". Mas com muita alegria viajei para a Bahia, fiquei no Assentamento Terra Vista, em Arataca, e lá os assentados torceram para a Argentina com fervor. Entendem que essa quase cultura de ódio é uma estratégia do império para que os latino-americanos não sejam unidos. Que nós da América Latina juntos seríamos tão fortes e independentes que nenhum país imperialista seria capaz de nos dominar. Mas essa é história para outro post.