terça-feira, 27 de setembro de 2016

Mães contra o Estado

   Dia desses estava relendo o post Nem Puta Perde a Guarda de Filho, já que é por ele que dezenas de mães chegam até aqui. E relendo, além de achar que o texto deva ser melhorado, percebi que deve também ser reeditado. Lá conto como é torturante repetir a mesma história, quase todos os dias, para pessoas em geral e psicólogos, advogados e jornalistas, em particular. Que no início pensei que fosse única, mas já conhecia mais de 10 mães na mesma situação. Passados alguns anos, muitas procuram desesperadas algum tipo de auxílio e se encontram naquele texto. Cada julgamento, cada passagem por fórum, ficar presa na esquizofrenia do sistema judiciário, ficar afastada do filho judicialmente, perder saúde, dinheiro, emprego, terminar relacionamentos, não terminar projetos. Viver num looping surreal infinito. 
   A reedição seria que agora não são mais de 10. Conheço mais de 50 mães e tenho conhecimento de mais umas 50 que perderam a guarda do filho. Mas tudo parece ter piorado muito com o a instauração da Lei de Alienação Parental. Os homens estão se beneficiando desta Lei. E não é mais apenas por vingança ou para parar de pagar pensão. Também para continuar abusando sexualmente dos filhos. Resumirei tentando explicar o inexplicável: As mães, primeiro incrédulas, depois em desespero por perceber o abuso, afastam os pais pedófilos. Esses pais entram na Justiça rapidamente e conseguem a guarda dos filhos. E então as mães ficam meses, anos, sem ver os filhos. E o "Estado", aquele que deveria proteger, entrega o inocente para os monstros. Comecei a desconfiar de um tremendo esquema de pedofilia entre o Poder Judiciário e Parlamentar. Não tenho provas, mas tenho convicção.
   Outra mudança na minha saga é que não é mais torturante repetir a história. É muito desgastante, sim, mas já consigo rir até da passagem pelo Fantástico, com a voz assustadora de Cid Moreira dizendo que eu sofria de graves problemas mentais. Baseado em que mesmo? No que a outra parte disse. "Ah, Rede Globo, faz tempo que não acredito em nada do que você mostra ou defende".
    Agora estou naquele limiar entre minha história e as outras, praticando o distanciamento. Quero ouvir mais do que concordar. Me vejo trabalhando nisso. Com muito envolvimento, mas sem tanto sofrimento. Estou na fase em que sofro mais pelos outros do que por mim e minha filha. O que foi feito, foi feito. Não quero deixar que continuem fazendo. Apenas isso.

    A Rede Materna ficou tão grande, tão interligada, que a querida Flavia Werlang me falou de uma mãe que estava tão mal que nem conseguia visitar o filho. Descobrimos que era a mesma mãe que conheci há mais de um ano. Uma foi escrevendo para outra, que colocou outra da mesma cidade na história e de repente essa mãe no estado de negação, em que o próprio "psiquiatra" disse ser melhor não ver o filho (!), encheu-se de coragem, cercada de amor e foi. E conseguiu abraçar muito o filho. E não voltou tão vazia. Mais do que lastimar a perda, temos de valorizar os ganhos.
    Foi o que fez a doce Lívia Guimarães, que após quase 4 anos sem ver os filhos, passou uma noite com eles. Não parava de olhá-los dormir. Quantas noites passamos em branco pensando em como, onde e com quem eles estariam? E como é maravilhoso passar uma noite acordada vendo como eles dormem. E perceber que o tempo, a distância, a amargura, a luta inglória, nada foi capaz de diminuir o tamanho deste amor. 
     E cada mãe que conheço, cada nova voz, cada sotaque vindo de todas as partes de tantos brasis, me derruba e me levanta. Muitas noites não durmo por aflição. Este ano uma mãe se matou. Todas nós pensamos em morrer, em algum momento, porque se não é fácil seguir na luta pelo direito da maternidade, é mais difícil desistir dela. Não há como se conformar com um sistema judiciário que nos tira um direito. Então temos de lutar. Mas daí acaba a saúde, o dinheiro, a dignidade, a força. Não há como desistir de um filho. É como desistir da vida. E foi isso que aconteceu com uma mãe. Ela desistiu de lutar pelo filho, desistindo assim da própria vida.

    Parei um pouco antes de continuar a escrever. Não quero que a emoção me tire o sono de novo, me aperte o peito, me faça chorar. Quero ser prática. O que vejo nessas mulheres é uma força descomunal em continuar. E vejo tanta beleza. São todas muito lindas, com sorrisos que iluminam o olhar triste. Com olhares profundos que escondem sorrisos irônicos. Todas enlouqueceram um pouco. Todas tornaram-se seres mais desconfiados, com um tanto de amargura, com tantos altos e baixos, que levam a vida numa gangorra emocional e financeira, mas não perdem a ternura. Não deixam uma irmã sem resposta. Me incluo nisso tudo. Temos tanto em comum apesar de nossas distâncias geográficas, criações, sotaques, formações, DNA. Porque a vida que levamos após o início do processo é praticamente idêntica. 
    Cansamos de brigar com a outra parte. Isso é peixe pequeno. Nossa briga é coisa de cachorro grande. Pessoas são pessoas e algumas se transformam, todas decepcionam, casais brigam, uns são mais vingativos, outros são passivos e assim sempre será. O que não pode é um Sistema pago por nós, acabar com a nossa vida. Chego a pensar que esses processos infindáveis só servem para alimentar a máquina. Pagamos peritos, pagamos técnicos, pagamos advogados, alguns pagam juízes (não tenho provas, mas tenho convicção). E tudo isso para quê? A tal Lei de Alienação Parental existe, mas percebo que o Estado é o que mais aliena. Segue a Lei
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/...

  No Art. 2, parágrafo único, existem as seguintes cláusulas:

II - dificultar o exercício da autoridade parental; 
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; 
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; 



   Ora, o que fez o sistema judiciário esse tempo todo além de dificultar o exercício da minha autoridade parental e destas mães? Nos impedem de ver nossos filhos até que as perícias, que demoram meses e até anos para serem marcadas, fiquem prontas. Demora anos para marcar audiência para regulamentação de visitas. Para que perder nosso precioso tempo com inúteis audiências de conciliação, sendo que qualquer acordo entre as partes pode voltar atrás a qualquer tempo?

    Pois é Estado de Direito, somos muitas mães espalhadas pelo Brasil para provar com muita convicção que é você, Estado, seu sistema falido e seus profissionais mofados, o causador de nossos danos e de nossos filhos. E sabe, Estado, tem advogada que também não te aguenta mais e podemos mover uma ação conjunta contra você. Podemos até morrer antes do fim desta ação, mas vai ter muita matéria, muita audiência, muito barulho. E se um dia nossa indenização milionária chegar e estivermos mortas, nossos filhos, as maiores vítimas, poderão usufruir das suas migalhas.