terça-feira, 6 de dezembro de 2016

A Madrugada dos Canalhas e a União dos Aflitos


    Só fui perceber que fiquei muito tempo sem escrever por aqui porque já é dezembro e fui mostrar o último post para Dora. Todo cheio de amor, união e esperança, sobre o Show de Talentos da Teia. Custei a dormir, primeiro porque não canso de olhar Dora e Miranda dormindo juntas, abraçadas. Segundo porque pensei sobre o último mês e os acontecimentos pessoais e mundiais que me impulsionariam a escrever. Sorri ao lembrar um comentário de Dora: “Quando acabar 2016, vão colocar: dirigido por Quentin Tarantino”.
    Nesses dias elegeu-se Donald Trump como presidente dos Estados Unidos. E eu já estava bastante abatida com a vitória esmagadora do retrocesso e imbecilidade nas cidades de todo o Brasil, principalmente na cidade de São Paulo, onde moro, e do Rio de Janeiro, onde tanta gente incrível que conheço, mora. Duas cidades símbolos do Brasil. Então vejo Trump ser eleito, ao mesmo tempo em que leio o que posso, o que me enviam, o que me indicam sobre Estado Islâmico, Nação Árabe, Grupos Terroristas e Crime Organizado. Tudo para o trabalho final de um curso que fiz sobre Geopolítica e Grupos Terroristas. Fiquei tão cheia de informações e ideias que não conseguia mais dormir.
   Indo para um Encontro de Nadadores, que ajudei a idealizar, onde encontraria os melhores amigos, os mais antigos, os que não vejo há décadas, os que vejo sempre, levei um tombo. Fraturei o nariz em duas partes. Sangrei até quase desmaiar, senti muita dor, fiquei inchada, não fui. Me neguei a escrever sobre mais um acidente no lugar de um encontro cheio de emoção, lembranças e abraços. O mundo não precisa disso. Nem eu precisava...
   E um dia eu acordo às 6h, como de costume, faço café, me preparo para escrever o tal artigo para o curso e ligo a TV para ver as notícias do dia. Um avião havia caído. “Nossa, lá vem mais uma tragédia mundial”. Estava toda a equipe do Chapecoense. Conforme fui ouvindo o desenrolar da história, fui me dando conta da importância do fato. Não era “apenas” um acidente de avião, que choca por ter mortes simultâneas e coletivas e, direta e indiretamente, afetar um grande número de pessoas, num efeito dominó. Era um acidente com duas equipes inteiras: de futebol e de jornalismo. Eram pessoas que iam para a final de um campeonato internacional, todas com o mesmo destino: fazer o melhor trabalho, trabalhando no que gosta. Quase o sonho de quase todos. Era um time pequeno que ficou grande. Eram jornalistas especializados, alguns tão grandes, tão generosos, que mostravam as melhores imagens para todos, sem distinção, e nunca se mostravam (assim são os cinegrafistas, ao menos, todos os que já conheci).
   Então, para sair do choque emocional que uma tragédia como essa causa, imediatamente comecei a ver o fato de forma jornalística. Não era só uma tragédia nacional, era também o maior acidente aéreo da história envolvendo atletas. E quando envolve atletas o choque é maior. Porque sabemos que atletas estão sempre juntos, na alegria e na tristeza, na explosão de raiva e na explosão de choro. Os atletas, na minha humilde opinião, são o maior símbolo de união. Porque são muitos e estão sempre juntos. Repórter com cinegrafista e fotógrafos também, mas em escala e tempo menores. Talvez por isso, em pouco tempo já eram mostrados, em retrospectiva, os acidentes com a equipe de futebol do Torino, da Itália, e da equipe de Rugby do Uruguai. Ou seja, o da Chapecoense será lembrado para todo o sempre. E ainda mais se outras tragédias acontecerem. Porque eram atletas e estavam voando atrás de seus sonhos e objetivos: ganhar o campeonato e disputar a Libertadores da América.
   A princípio o que vejo na mídia nacional é a exploração de lágrimas, imagens repetidas de avião destroçado. A TV Globo, enquanto não chegavam realmente notícias, ficava mostrando repórter entrevistando repórter esportivo que era amigo de algum repórter morto. Jogadores de futebol amigos dos jogadores mortos. Arrancavam lágrimas para tirar mais lágrimas.
   E no meio da comoção mundial, na madrugada seguinte a esse acidente tão trágico, os congressistas brasileiros trabalharam sem parar. Mas não foi com diplomacia, relações internacionais ou coisa parecida, já que o acidente aconteceu na Colômbia, com avião boliviano. Os congressistas nacionais passaram a noite votando em medidas que congelam salários, aumentam o tempo de aposentadoria, tiram vários direitos trabalhistas e dão vantagens a empresários. Também votam o fim da Operação Lava Jato, aquela mesma que era para acabar com a corrupção. Mas só com a corrupção do PT, porque PSDB, PMDB e demais partidos podem continuar roubando e corrompendo a vontade.
   Esses congressistas não são nada menos do que canalhas. E todas as pessoas que apoiam o Governo Michel Temer são imbecis ou canalhas. E a mídia do mundo inteiro sabe o quanto foram desumanos e canalhas ao votarem na calada da noite, enquanto pedaços de corpos de brasileiros mortos estavam sendo recolhidos. Espero que daqui a 50, 100 anos, essa madrugada seja lembrada como a madrugada dos canalhas.
   Mas 2016 também teve e ainda terá coisas boas, que escreverei depois, pois agora as estou vivendo.