terça-feira, 1 de abril de 2014

O Futuro Estarrecedor

      O relatório divulgado ontem pela ONU mostra um futuro sombrio e, praticamente, insuportável. Foram mais de 700 cientistas de 100 países para reafirmar o que já foi avisado na Eco 92, no Rio de Janeiro: o homem e sua ganância, o “progresso” que acaba com florestas, água potável, oceanos e oxigênio, vai tornar a vida no planeta maravilhoso, cada vez mais difícil. O pior que esses danos são irreversíveis e não imagino a humanidade, milagrosamente, tomando consciência disso. Nem vislumbro os governos, principalmente dos EUA, usando alta tecnologia para criar soluções sustentáveis, pois ainda preferem investir em armamento bélico, assim destrói tudo mais rápido.
    Em 2050, segundo os cientistas, a África estará sem água, a China sem ar e plantações, a Europa sofrendo enchentes e o Brasil com clima seco e temperaturas muito elevadas (nós temos o triste posto de campeões de desmatamento no mundo). De que adianta eu me cuidar, fazer esporte, ter expectativa de vida aumentada se quando chegar aos 80 anos (se não “morrer de susto, bala ou vício”  – como cantou Caetano Veloso) mal poderei respirar e tomar água?
     Não era por rebeldia ou feminismo radical que eu dizia, na adolescência, que não queria ter filhos. É que desde muito cedo tomei consciência da destruição humana. Até 1982 era possível ver tartaruguinhas saindo das cascas e correndo para o mar no Costão das Tartarugas, o Tortuga, na praia da Enseada, Guarujá. Mas então a Prefeitura da época liberou a construção de três prédios de 30 andares bem ali na frente da praia, onde até hoje não é permitido prédios de mais de quatro andares. E as tartarugas sumiram. Vieram ambientalistas de toda a parte fazer manifesto, me juntei a eles, conheci o Greenpeace e outros radicais. Não houve alemão que fizesse mudar o quadro ou fazer cumprir a “Lei”. 
    O grande golpe, a apunhalada final foi saber que meu pai vendeu material para a construção dos malditos prédios horríveis que enfeiam a paisagem até hoje. Minha vontade era implodir tudo aquilo. Foi nossa primeira briga feia. O chamei de capitalista selvagem, exterminador de animais. Ele tentava me explicar que se não fosse ele, outra distribuidora de cimento venderia, não tinha jeito. Graças àquela construção sinistra, meu pai comprou a primeira casa própria. Ele dizia que queria me dar o melhor. Eu respondia que o melhor para mim era continuar vendo as tartaruguinhas correndo para o mar. Tinha 12 anos e uma utopia juvenil meio doentia. Depois entendi que lutar contra o sistema só sendo muito radical mesmo, extremista, tipo luta armada.
   Continuei não querendo colocar mais gente nesse mundo com excesso de população, mas aos 30 anos, quando engravidei sem planejar, pensei que seria maravilhoso poder passar meus ensinamentos e consciência ambiental para alguém. No tempo de convívio que tive com Dora, minha filha mais velha, sei que passei os melhores valores de preservação, respeito e proteção animal e ambiental. Tanto que, aos 8 anos, ela já falava que queria fazer Biologia Marinha. Adorava os oceanos e a vida no mar. Miranda, minha filha mais nova, de 5 anos, diz que quer ser veterinária. 
   De certa forma elas são bem mais práticas e efetivas do que eu. Depois de me envolver na causa ambiental, fui me interessando por várias outras: proteção animal, legalização do aborto, eutanásia, inclusão social, acessibilidade universal, feminismo... é muita causa para uma pessoa só. Daí me iludi pensando que fazendo jornalismo poderia denunciar, divulgar, esclarecer e conscientizar sobre tudo isso. Talvez fosse inocente ou uma arrogante. Ou os dois. Só sei que fracassei. Minhas filhas serão mais práticas, tenho certeza. Assim como tenho certeza de que acertei tendo essas duas filhas, que poderão fazer diferença nesse futuro macabro que nos espera.
   O ser humano se adapta fácil. Penso que esse período em que Dora é obrigada a morar na cidade de clima mais quente e seco que já conheci é uma espécie de preparo para sua vida adulta num mundo de tantas mudanças climáticas.  Pensar no futuro é estarrecedor, por isso vou aproveitar e tomar muita água, mergulhar nas ondas enquanto as temperaturas permitem e tratar de procurar um terreninho na montanha, com cachoeira no quintal. Igual ao lugar lindo que eu morava com Dora em Paraty (RJ).

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