terça-feira, 10 de setembro de 2013

A Decisão de Champignon

    É muito difícil escrever quando o acontecimento é tão recente, mas é isso que os jornalistas fazem o tempo todo. Esse espaço não é jornalístico, mas, de certa forma, escrevo também sobre atualidades. O suicídio do Champignon me chocou muito mais do que a morte por overdose do Chorão. Fiquei sabendo de uma forma bizarra, não tinha visto TV, acessado internet, nada... e ontem, às 19h, vejo o recado de uma amiga: "morre o Chorão, morre o Champignon, só não morre...". Achei que era uma brincadeira de humor negro, custei a acreditar, tive que ler a notícia no  computador. É triste demais a  banda Charlie Brown Jr ter agora esse estigma de tragédia. Pior é ler os inúmeros comentários imbecis acerca da morte do Champs. 
    Quando vi esse garoto tocando pela primeira vez, ele não tinha mais do que 15 anos, já era um baixista virtuose. Parecia uma criança! Eu sempre presto muita atenção nos baixistas, talvez porque tenha um desejo enrustido de tocar baixo. Nessa época o Charlie Brown ainda tinha outro nome e cantava em inglês. Foi no emblemático Bar do Torto. Já escrevi aqui o que essa banda significa para a cidade de Santos e não faz muito tempo. Ao contrário dos dias ensolarados da morte e enterro do Chorão, aqui hoje está muito cinza e frio.
      Tem gente chamando o Champs de covarde, de drogado, de louco... não importa. Para  mim será sempre o garoto simpático e tímido, que me surpreendeu ao assumir os vocais na Banca (talvez a banda de carreira mais meteórica de que se tem notícia). Por que ele se matou? Talvez excesso de filosofia, porque o suicídio é a morte filosófica, é decidir não querer ficar mais aqui. Por ter esse perfil tímido, talvez ninguém tenha percebido que suas recentes perdas também o deixaram perdido, só talvez...
        Homenagens  póstumas, programas de TV, críticas, tudo isso vai acontecer no próximo mês, mas o que a decisão de Champignon traz a tona é o sentido da vida, o existencialismo. Quantos adolescentes estão sofrendo pela primeira vez por um suicida? Por que as religiões, que provocam guerras desde que o mundo é mundo por discordarem em seus dogmas, só não discordam na condenação do suicida? Será por que se todos começarem a se matar não haverá mais fiéis, crentes ou religiosos praticantes? Será o suicida um fraco ou um forte? Será que queria mesmo morrer ou apenas pedir socorro? Imagino quantas pessoas estão questionando-se sobre isso a partir de ontem. Muitos que  nunca pensaram nisso.
      Também talvez eu consiga escrever porque o Champignon era um conhecido distante. Tive muitas perdas de pessoas muito próximas esse ano e não consegui escrever sobre elas. Talvez nunca consiga ou daqui uns 10 anos, quem sabe. É triste ver os urubus buscando imagens mórbidas do Champs. Criticando uma atitude pessoal e intransferível. Tudo isso é triste demais.

       Na semana passada, uma amiga virtual (que quero muito conhecer pessoalmente), Giovana Lizana*, fez uma provocação sobre Morrissey (The Smiths) e Robert Smith (The Cure), que se eles realmente fossem verdadeiros no que cantavam, já teriam se matado. Brincou como se eles fossem posers*. Entrei na defesa dos meus ídolos da adolescência, dizendo que eles não terem se matado é um alento para quem tem depressão e que poser então era o Chorão, que cantava positividade e cometeu um suicídio inconsciente. Claro que era tudo provocação e jamais poderia imaginar que uma tragédia ainda maior na banda estava por vir. E hoje, conversando com Marcia Abad sobre o Champs e essas provocações, ela disse que mais do que cantar os desgostos da existência, o que Morrissey e Robert Smiths faziam "era uma catarse, um jeito de mostrar o sofrimento para mundo e assim, continuar vivendo". 
       


*Giovana é uma garota linda e inteligente que acaba de completar 19 anos, escreve brilhante e verdadeiramente em seu blog Little Wild One, tem muitas crises de depressão e eu desejo imensamente que ela não se entregue e não morra!

*Pra quem não sabe, poser é uma gíria usada para tudo que finge ser o que não é.


2 comentários:

  1. Adriana, concordo com você que quando diz que o chorão também cometeu suicidio, existe varios tipos de suicidio e overdose é uma deles. Acho que nos dois casos do Champs e do chorão, faltou mais que o sentido da vida, acho que a mente deles se perdeu no tempo, entre o passado e o futuro e se esqueceram do agora. acho que no mundo de hoje as pessoas não vivem o agora e isso causa muita dor sofrimento e falando em psique coletiva, causa guerras e intolerancia religiosa, ou em nome de um futuro de gloria e salvação ou em nome de um passado. Ambos passado e futuro só existem na nossa mente. O agora tem que ser sentido, presenciado e vivido. Passei por muito sofrimento no ultimo ano (separação de um casamento de 10 anos, ficar longe dos meus filhos, um tumor na cabeça, cirurgia)e agora o sofrimento começou a diminuir porque parei de viver no passado ou projetar um futuro. A magia da vida está no agora, no presente. E hoje eu vivo o meu presente plenamente. Falando nisso, estou escrevendo um texto que dedicarei a você, você nem sabe mas a sua historia, a sua luta,seus textos, enfim, você, me inspiraram muito e me fizeram ver muitas coisas que não enxergava. grande beijo

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    1. Saber que pude influenciar alguém de forma positiva já faz valer a pena, acho que a gente só escreve com esse objetivo, senão, não faz sentido nenhum. Por algum motivo nossas histórias se cruzaram nesse momento da vida, nessa teia do destino que tentamos, mas não conseguimos entender. Obrigada e fico aguardando seu texto :) Beijos

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