quinta-feira, 19 de setembro de 2013

O Crime da Rua Cuba

     Véspera do Natal de 1988, um crime choca o País. O advogado Jorge Toufi Bouchabik e sua mulher,  Maria Cecília Delmanto Bouchabik, foram brutalmente assassinados em sua casa, na Rua Cuba, num bairro elegante e muito rico de São Paulo, e o principal suspeito era o filho mais velho do casal, então com 19 anos, Jorge Delmanto Bouchabik. Eu tinha 18 anos, já cursava jornalismo na Unaerp de Ribeirão Preto e acompanhei cada linha da investigação. Que loucura seria um filho matar os pais por ter divergências tão comuns entre pais e filhos! Se não fosse o rapaz, que terror perder os pais de forma tão trágica e ser acusado por isso!
       Uns seis meses depois estava eu na festa Túnel do Tempo, na lendária república estudantil Taberna dos Índios. A festa estava incrível, tinha desde homens das cavernas a guardiões do espaço. Minha fantasia era de uma cortesã do século XVIII, estava me achando linda! Estava tão lotada que mal conseguia chegar ao bar para pegar uma cerveja ou água e comecei a ouvir reclamações dos "convidados". Como eu era frequentadora da república me coloquei a trabalhar no bar para ajudar. Meu namorado, Siquila, um estudante de Publicidade, não gostou muito, porque perdeu a namorada para servir os beberrões. Toda hora aparecia um rapaz dos anos 50, com topete, camiseta branca, jaqueta de couro, calça jeans, muito charmoso. Puxava papo comigo, pedia sempre água. Logo percebi que estava sendo paquerada, fui simpática, como sempre sou quando a paquera é inofensiva. Na hora de  sair me deu um cartão e disse: "Se puder, me liga!". Havia um número de telefone e o nome Jorginho. Meu estômago retorceu, era o "Jorginho da Rua Cuba"!
     Então fiquei sabendo que ele acabara de passar no vestibular de Direito na mesma Unaerp. Conversei com a Gigi (Gisele Bastos) e Soraya Caldana, as adoráveis garotas de Campinas com quem eu dividia o apartamento. Iria ou não iria ligar? Decidi que sim e falei com meu namorado, que mesmo muito enciumado, concordou que eu ligasse para tentar desvendar alguma pista perdida daquele crime misterioso. Liguei para o Jorginho, que ficou de me pegar na faculdade para jantarmos. Contei para meus amigos da faculdade Fábio Diegues, Celso Castro, Cláudia Rubio, Cristina Dalto e tantos outros, combinamos que eu estaria até 1h da manhã no bar Noite Sem Pressa e, caso eu atrasasse mais de uma hora, poderiam ficar preocupados. Não havia celular na época, nem internet e eu iria sair com o suspeito de um crime terrível!
     No horário combinado, Jorginho abre a porta da minha sala de aula, os mais de 50 alunos viraram-se para ver. Claro que numa sala de estudantes de jornalismo a curiosidade era unânime e as notícias corriam como Bolt. Fomos para um lugar bem legal e movimentado, de lanches, que era mais a  cara de quem  tem 19, 20 anos. Ele era gentil, educado, simpático e inteligente. Em meia hora me perguntou: "Você sabe quem eu sou, né?". Sim, sabia e fui sincera ao contar que estava ali por curiosidade e que acompanhava toda a história do crime. Jorginho disse que quando viu que eu era do Jornalismo pensou em voltar, mas tinha me achado "encantadora" e precisava me conhecer melhor, mesmo com medo de estar em alguma primeira página de jornal no dia seguinte. Agora era conhecido como Jorginho da Rua Cuba e isso  lhe doía demais. Mudou para o interior tentando o anonimato, mas percebeu que isso seria impossível. Ao pagar a conta pediu a nota e disse que tudo o que gastava precisava ser notificado. Triste...
     Tenho o dom de fazer as pessoas se abrirem comigo e talvez esse seja o meu maior trunfo como repórter. Em pouco tempo ele me contou muito do seu calvário e pediu que não contasse a ninguém. Nunca contei, faz parte do meu código de ética. Em certos momentos seus olhos enchiam-se de água, ele respirava e voltava a falar. Sua dor era sincera. Em nenhum momento disse "sou inocente" ou "não fui eu". Seus irmãos o apoiavam, seus avós o amavam, muitos amigos o abandonaram. Contei também de mim e porque saí de Santos e fui parar naquela terra quente e seca (esse é assunto para outro post). Falei dos meus pais, amigos,  aptidões, imediatismo e espírito investigativo. E disse exatamente porque fiquei tão impressionada com essa história, sendo culpado ou não, já estava marcado e sendo julgado por um País inteiro. 
     Tomamos sorvete e pedi para me levar ao tal bar, pois iria encontrar amigos e meu namorado, perguntei se queria ir, não quis, pois não precisava ser observado por uma dezena de aspirantes a jornalistas. Jorginho, definitivamente, não gostava dessa categoria. Quem diria que duas décadas depois eu também passaria a ter certa aversão pelos formados em  Direito...
       Entrei em seu carro e ele pegou um caminho oposto, disse que precisava passar na casa dele. Confesso que senti  medo, quando ele parou na porta, preferi não entrar. Voltou com um ramalhete de flores do campo lindo! Então me disse que se eu fosse como imaginava me daria as flores. "Se eu soubesse, teria também comprado bombons, porque você é mais doce e inteligente do que linda". Só não me apaixonei porque já era completamente apaixonada pelo Siquila. Jorginho não tentou nem me beijar, foi  gentil, elegante e respeitoso. Foi encantador mesmo! Me deixou em casa e combinamos de nos encontrar em qualquer oportunidade... ele só queria ter amigos! 
     Coloquei as  flores  no vaso e fui ao  tal bar encontrar meus colegas sedentos  por notícias. Contei exatamente o que conto aqui, com mais riqueza de detalhes, afinal passaram-se 25 anos! Nos falamos mais algumas vezes e talvez fôssemos amigos, se eu não tivesse voltado no final de 1990  para Santos. Acabei namorando 5 anos com o Siquila, hoje advogado, muito bem casado, que aceitou, mas não gostou nada desta história.
       Soube que Jorginho acabou expulso do curso pouco antes de terminá-lo, por pagar a faculdade com cheques roubados,  nem sei se isso é verdade. Sei que até hoje esse crime não foi solucionado, que ele e seus irmãos já processaram jornalistas, emissoras e não ganharam. E isso me faz pensar que talvez exista sim crime perfeito. E que a Justiça é tão lenta, mas tão lenta, que quando se concretiza, não pode mais ser chamada de Justiça.
     

23 comentários:

  1. Conte mais detalhes..fiquei curiosa para saber mais detalhes.

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    1. Então... o que pediu para não ser contado, não posso contar... mas o que mas vc quer saber? rsrs

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    2. Daquilo que você pode contar: ele falava algo sobre a figura do pai? se os pais brigavam muito entre si?
      Acompanho o caso da rua Cuba há alguns anos. Já li e ouvi varias versões para o crime, e a que mais me intriga é a possibilidade suscitada pelo Paulo José da Costa Jr.
      Na época do crime, parece-me que a imprensa divulgou que não havia conflito entre o casal, já no livro do Paulo José, ele cita que a relação do casal era conflituosa.

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    3. Lucas, lembro que a figura da avó era muito importante, falava da avó como se falasse da mãe. Manda um email pra mim mendes_jornalista@yahoo.com.br vamos trocar figurinhas sem tanta exposição.. quem sabe a gente consegue desvendar esse mistério?

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    4. ainda tem contato com o Jorginho?

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    5. Que materia nojenta e mentirosa. O proprio Jorge diz que nunca foi chamado Jorginho e que tomou horror a esse apelido apos i crime. Seu apelido era Jinho. Vc deveria ser pricessadacomo oportunista escrota. E ainda deixa no ar uma possibilidade de crime com cheques frios....deus se apiede de vc

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  2. Muito bom e curioso! De tudo que falou apenas uma certeza, justiça imprestável!

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    1. Pois é, se Jorginho é culpado, está livre há 25 anos, se não é, é julgado há 25 anos... de qqr forma, o culpado está impune!

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  3. Excelente, Adriana! Sigo muitos crimes misteriosos! Adoro! Vou ler seus outros textos!
    Parabéns!

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    1. Obrigada, também adoro, acho que foi de tanto ler Agatha!

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  4. Sou advogada, e pelo que sei, o Jorginho Delmanto (é assim conhecido no meio jurídico), é advogado atuante, e pelo que parece mora em São Paulo, já que tenho conhecimento, através de uma amiga funcionária pública, que ele sempre esta na Justiça Federal da Av. paulista.
    Como se diz: Enquanto não há trânsito em julgado, não há culpado.
    Adorei o blog, vou ler TUDO....rsrsrsr

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  5. Que legal, Janaína! Obrigada, lendo vc vai ver os desmazelos do judiciário (que vc já deve conhecer) ... bjs

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  6. Eu conheci ele, frequentei o apartamento dele..morava perto da minha casa....sem saber quem realmente era.... Descobri depois que ele ja tinha partido...Mas lembro deum detalhe. Uma vez no ap dele, ele veio me mostrar um canivete suiço que tinha comprado..Mostrou cada uma das lâminas vendo uma complexidade naquilo e os olhos dele brilhavam,......

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    1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    2. Claudia, gosto de fazer trilhas pela mata e não dispenso um canivete, tenho uma coleção e verdadeira paixão por eles (principalmente os suiços). Assim como eu, tenho outros amigos "aventureiros" que também gostam e colecionam. Não vejo nada de estranho o fato do Jorginho ou qualquer outra pessoa também gostar !!

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    3. Deixa o cara ser feliz com os canivete dele...

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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  8. Eu soube recentemente, que o pai era violento e espancava a mãe, no dia do crime o jovem chegou em casa, os pais brigavam, o pai atirou na mãe, ele matou o pai. Teve proteção dos avós, avô advogado e pai da mãe. Não sei se é fato.

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  9. Eu soube recentemente, que o pai era violento e espancava a mãe, no dia do crime o jovem chegou em casa, os pais brigavam, o pai atirou na mãe, ele matou o pai. Teve proteção dos avós, avô advogado e pai da mãe. Não sei se é fato.

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    1. Vc so falou besteira, o mlk matou os Pais por $$$

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    2. Sim.Ele foi o assassino dos pais!E de família muito rica e infleuente.herdou toda fortuna.Sei tio um juriosta providenciou sua liberdade.Afrimou que ele ficaria sem estrutura, sem familia.Eu devai ter 20 anos e trabalhava px dos Jardins.

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