terça-feira, 23 de outubro de 2012

O dia em que conheci Claudio Tognolli e Rodrigo Vianna

    Pensei que seria mais uma matéria banal sobre o movimento pró-reabertura dos cassinos, com muitos políticos e empresários. Como seria um evento no Hotel Casa Grande (um 5 estrelas conhecido na cidade de Guarujá - SP) e com show de Fausto Fawcett, da famosa música Kátia Flávia (a Godiva do Irajá), seria divertido. A canção composta por Fausto tocou muito nas rádios, o que tornou esse jornalista, autor teatral e escritor de ficção científica, uma figura conhecida.  Apesar de não concordar com o lobby dos cassinos, seria interessante um show com Loiraças Belzebus.
    No meio da multidão vi um cara com olhar agitado e óculos de grau igual ao meu, deveria ser um jornalista. Me aproximei, me apresentei como repórter do jornal Diário da Cidade, caso ele precisasse saber sobre alguém ou alguma coisa da Baixada Santista. "Obrigada, sou Claudio Tognolli" e logo comentou sobre nossos óculos idênticos. "Mas você não é repórter especial da Folha de São Paulo?". Lia as matérias do cara e achei curioso que o mandassem para fazer uma de puro lobby, isso seria coisa mais para um iniciante ou correspondente na Baixada.
    Com seu jeito rápido de falar sobre tudo, me esclareceu que estava ali atrás do bicheiro Ivo Noal, foragido da polícia há mais de 6 meses. Ele estava atrás desse cara e tinha certeza de que o encontraria ali. Eu nem sabia que esse Ivo Noal existia, mas achei o máximo poder participar dessa investigação. Então saímos pelos corredores do Hotel, dando uma de perdidos. Até que Claudio avistou o foragido! Corremos feito loucos atrás dele, eu com minha filmadora VHS, que tinha levado para gravar o show, ele com uma máquina minúscula, portátil, sem recursos, mas que deu  muitas capas para o jornal. Cheia de adrenalina e um pouco esbaforida, segui por outro lado, para tentar cercá-lo. Em vão, o cara sabia como fugir e deveria ter um carro importado esperando na saída. Perguntamos para vários dos presentes sobre o aparecimento do bicheiro, ninguém sabia, ninguém viu, como se fosse um fantasma que só nossa mediunidade avistou.
   Novamente no salão, Tognolli acena para um repórter de TV, alinhado e charmoso, com microfone em punho. Era Rodrigo Vianna, que acabara de sair da Folha de São Paulo e estava em uma de suas primeiras matérias para a TV Cultura. Narramos o acontecido e Rodrigo ficou arrasado por não ter captado essa imagem. "Mas ela tem!", apontou Claudio. Na mesma hora entreguei minha fita para Rodrigo, que adiantou que a Cultura não paga imagens, mas colocaria meus créditos como cinegrafista. Adorei! Mas pedi para devolver depois, já que também haviam imagens pessoais de shows e viagens.
    Enquanto eu fazia anotações para a matéria que só entraria no dia seguinte, vi Tognolli ligar para a redação e ditar cada palavra e vírgula do texto que abriria uma página. Sem erros, com precisão cirúrgica. Não havia internet, nem telefones celulares. Depois Claudio dispensou o táxi e eu o levei até onde estava hospedado. Mas antes ficamos sentados no calçadão da praia, ouvindo o barulho do mar e conversando sobre jornalismo, investigações e rock. Para minha agradável surpresa ele era totalmente rock, já havia entrevistado metade dos meus ídolos e tinha uma coleção de guitarras. 
   Minha matéria ficou infinitamente melhor do que eu mesma imaginei. Escrevi com muita vontade na manhã seguinte. Recebi ligações dos dois jornalistas. Claudio para trocar figurinhas, Rodrigo para passar um endereço em que ele pudesse entregar a fita e me agradacer mais uma vez. Com certo orgulho assisti ao jornal da Cultura, com as imagens do bicheiro Ivo Noal rindo e bebendo com os engravatados, depois correndo por corredores, com minha câmera atrás dele. Nos créditos aparecia Imagens Adriana Mendes.  O jovem e promissor repórter de TV deixou  meu material na casa da avó de uma amiga, em São Paulo. Dona Alice ficou encantada com a educação, beleza e gentileza do rapaz.
    Com Rodrigo Vianna não encontrei mais pessoalmente, mas com Claudio Tognolli tive a oportunidade de outros encontros e coincidências e até o entrevistei antes do lançamento de um de seus livros, O Século do Crime. Pode ser que nenhum dos dois lembre-se deste dia ou desta matéria. Mas para mim, uma foquinha de 22 anos, foi marcante. Em poucas horas aprendi mais sobre jornalismo do que em um semestre inteiro de faculdade. O espírito investigativo e generoso de Tognolli, que não manteve para si a notícia, espalhando-a para outro veículo de comunicação foi uma demonstração de como fazer da profissão um bem de utilidade pública. Ético, não iria passar para um jornal concorrente, mas por que não mostrar imagens desta fuga para uma TV? Por que não enriquecer a matéria de seu colega? Como o professor universitário que também viria a ser, não se importou de me explicar quem era o bicheiro, que eu nem sabia que existia. Também não tive vergonha de dizer que não sabia. Rodrigo Vianna, por sua vez, mostrou sua gratidão e foi pessoalmente entregar uma fita caseira, na casa de uma senhora.
    Não é por acaso que Claudio Tognolli seguiu fazendo reportagens cada vez mais investigativas, em que teve de mudar, inclusive, a identidade. E Rodrigo Vianna não era só um profissional bem apessoado e de voz bonita. Sua preocupação social, com a ética e com os direitos humanos estão explícitos em seu blog. Adoro ler Escrivinhador, no  www.rodrigovianna.com.br. Sempre tem informação, com muita opinião.
     Aquela noite foi daqueles momentos de estar no lugar e hora certas. Mas, principalmente, com as pessoas certas. Era uma noite estrelada, num Hotel em frente ao mar. Poderia ter sido só mais uma noite tranquila, com uma matéria meio boba, sobre um evento que não dizia muito. Mas tornou-se numa espécie de marco para aquela garota foquinha. Foi uma noite apenas, mas que me mostrou que investigar e perseguir a notícia é ainda mais divertido que um show de rock.
   
   

4 comentários:

  1. Eu tenho aula com o Tognolli e em todas as quartas-feiras desde o começo do semestre eu vou para casa querendo mais e mais dessa aula.

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    1. Então aproveite mesmo e muito os ensinamentos do mestre. Esse cara sabe bem o que faz e é generoso o bastante para dividir seus conhecimentos como poucos. Aproveita também para perguntar se ele leu esse texto! Grande beijo!

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  2. Verdade,ele é sensacional. Um dos melhores professores de Jornalismo na FIAM FAAM. Se todos fossem iguais a ele eu não terei cancelado minha matricula lá. Tognolli uma vez me chamou de louca quando declarei a ele que sairia do Jornalismo para fazer Ciências Sociais. kkk Ele me motivou a concluir o plano de me desligar do Jornalismo. Mestrão!

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  3. Renatta, o Tognolli é um jornalista exemplar, tenho muitas histórias ótimas dele, que também foi uma espécie de mestre, além de ser o cara que está sempre no lugar certo e na hora certa :)

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