quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Chutando a Porta do Juiz

   Tento não cair na mesmice de fazer retrospectiva do meu ano. Mas é inevitável na hora que deito para dormir e penso que há quase três anos fui afastada da minha filha e no processo, que é quase o de Kafka. Lembro que 18 de dezembro do ano passado nos vimos. Foi quando parei de escrever sobre o processo. Tive que prometer isso para a advogada da outra parte, a mãe de Danilo Murari, o outro advogado. Não lembro o nome da mulher, achei-a tão ruim, tão má, tão inescrupulosa, que prefiro nem lembrar. Nunca vi seu filho, afinal foi uma única audiência e a representante legal da parte foi a advogada mãe, mais experiente em mentiras e maldades.
  Essa mulher veio de avião de São Paulo para “mostrar” ao juiz porque eu não poderia ver minha filha. Havia um acordo amigável, mas como fazer acordo amigável com o inimigo? Só num sistema falido há audiência de conciliação para quem vive no litígio. É perder tempo, é perder vida. No fim, acho que a tal advogada sem escrúpulos levou uma bronca do juiz, que deve ter começado a perceber que o objetivo deles é levar esse litígio até minha filha completar 18 anos e me esquecer. O convívio, a intimidade, já não existem mais. A tal advogada ligou para a minha para saber se eu estava disposta a ver minha filha, por uma hora e meia. Claro! Há quase dois anos tento isso!
    Foi marcado o encontro no consultório do avô José Hércules Golfeto, também psiquiatra infantil. Cheguei no horário combinado com Miranda, que já falava aos amigos que a irmã tinha morrido, que chorava tanto ao ver as fotos da irmã, que precisei tirar todas da casa. Fotos só no álbum. O pai de minha filha chegou 20 minutos atrasado. Nesse tempo o avô me contou como a neta é ótima, inteligente, educada (como se eu não soubesse), que é tão parecida com a tia Raquel que na rua pensam ser mãe e filha. “Que bom! Acho a Raquel linda fisicamente, sempre desejei que minha filha se parecesse com ela fisicamente”. Contou que ela está acostumada com tudo, é feliz, faz terapia e tratamento para alergias. “Que alergias?” Alergias que desenvolveu naquela cidade seca e abafada, alergia de ácaros!
  O avô também me contou que seu filho faria uma cirurgia delicada para colocar uma prótese na uretra e sua filha, a que parece mãe da minha filha, estava com um tumor no estômago. Fiquei penalizada por Raquel, até porque ela é a atual referência materna da minha filha. E também porque estava com duas pessoas que amava muito e continuarei amando sempre, doentes de câncer. O avô tentou conquistar Miranda e lhe fez várias perguntas, sempre muito manipulador.
  Enfim Dora chegou! Eu não vi sua entrada. Mas Miranda viu e tremeu tanto que caiu no chão, chorando. Parecia ter visto um fantasma e era isso que a irmã significava ou significa para ela: uma sombra, um fantasma. Dora também se jogou no chão e eu fui abraçá-las. Como havia crescido! Minha filhinha estava quase do meu tamanho, de olhos inchados e vermelhos (alergia), com peitos, começando a ter espinhas. Ela só chorava e me dizia: “Mãe, te amo tanto, tanto!” e me pediu “por favor, para de brigar”. Não sei o que falam para ela, mas eu só tento vê-la e me impediam de todas as formas. Minha briga era essa. Mas não quis falar sobre isso. Dora me pediu para falar só de coisas boas e para deixar tudo do jeito que está. Ela me perguntava de tudo, de todos, de seus amigos, dos meus amigos. Dava dó de ver... o encontro aguardado por um ano, 10 meses e 8 dias foi testemunhado pelo avô e pelas advogadas das partes.
  Quando Dora levou Miranda ao banheiro, fui atrás. O pai dela aguardava na sala de espera. E do lado de fora do consultório, havia segurança. A “visita” de uma hora e meia durou apenas uma. Porque, como disse o próprio avô: “Meu filho sempre se atrasa”, mas precisou sair 10 minutos antes, para levar sua brilhante advogada ao aeroporto. Foi muito pouco, mas eu a vi. Fui obrigada a prometer que não escreveria mais sobre o processo para poder ver minha filha. Exigência da advogada, não do juiz, porque afinal, quem sempre mandou nesse processo foi a outra parte e seus advogados.
   Terminei o ano de 2012 com esperança, porque em janeiro já nos veríamos de novo, era o acordo. No dia 8 de janeiro deste ano eu estava novamente em Ribeirão Preto, com Miranda. Mas a outra parte não me deixou encontrá-la. Estavam todos em Ribeirão Preto, mas ele tinha colocado a tal prótese na uretra e estava em repouso. E daí? Eu não iria vê-lo, a “visita” não era para ele! Os avós não poderiam levá-la até o consultório? Não, porque ele quer dominar todos os passos, porque seu único poder na vida é o poder pátrio e ele é o dono da filha. Minha advogada pediu para me colocar no lugar do avô, que estava com seus dois filhos doentes e que já era um idoso. Ora, esse “idoso” alguma vez se colocou no meu lugar? E no da neta? Não, nunca, jamais, mas eu acabo sendo rodeada por pessoas que se parecem comigo. Pessoas que sentem amor, empatia, compaixão e que não mentem.
  Sobre os filhos doentes, acho que era uma mentira. A tal prótese deve ter sido um sucesso, pois a outra parte vive indo e vindo para São Paulo. O tumor da filha deve ter sido uma invenção para ver se eu colocava a doença neste blog. Não, senhor psiquiatra, jamais usaria uma doença como o câncer para atingir alguém. Logo se vê que essas pessoas não me conhecem,  nem meu caráter, apenas reproduzem o que o filho diz e pensa. Eu tenho consciência. Já esse pai foi capaz de inventar um tumor para a própria filha!
   Então passei 4 dias em Ribeirão Preto, ligando, tentando mudar o dia da “visita”, mas o avô, que me atendia, repetia roboticamente: “Eu não mando nada, quem manda é o Jonas!” Deve ser muito cômodo passar toda a intolerância, desajuste e falhas para o filho. Nem sei quem é o mais doente naquela casa. Infelizmente, a única pessoa que vi padecer de verdade, foi minha filha, com essa alergia que a obriga tomar injeções semanais para o resto da vida. Ou até quando morar naquela cidade.
  Após vê-la, falar com ela por telefone no Natal (um avanço incrível) e no dia 31 de dezembro, fiquei cheia de expectativa positiva para o próximo ano. Mas não poder vê-la de novo me causou um transtorno físico, emocional e psíquico imenso. Que só profissionais da saúde mental, como os avós psiquiatra e psicóloga, seriam capazes de imaginar (ou de tramar). Fui ao fórum de Ribeirão Preto com minha advogada, para dar entrada numa liminar, exigindo a “visita”, provando que, mais uma vez, a outra parte descumpriu o acordo. Lucélia, minha advogada, repetia o tempo todo para mim: “Isso só vai ser pior para ele, vai deixar claro para o juiz que sua intenção é proibir o contato entre mãe e filha”.
  Esperávamos a resposta no cartório. Eu com Miranda nos braços, minha bebê enorme, que tem peso e tamanho de uma criança de 7 anos. Quando leio “vistas ao Ministério Público” peço para Lucélia traduzir. “Significa que ele não decidiu nada, mandou para o Ministério Público”. Mas e o tempo? Quanto tempo isso demora? “Uns dois meses”. Meu estômago revirou, dentro de mim senti uma bola de fogo que subiu para o rosto, para o cérebro, desci as escadas com rapidez e sangue nos olhos. Lucélia tentava me alcançar equilibrando-se em seu salto alto. Parei na porta do juiz e comecei a gritar a plenos pulmões: “Eu quero minha filha! Me deixem ver minha filha! Me devolvam minha filha!” Repetia continuamente essas frases. Miranda, que sempre sofreu tanto, chorava e gritava, uma policial feminina veio buscá-la e a levou para tomar água, enquanto eu continuava gritando.
  O Fórum parou. Um policial, que acompanha a saga desde o início, me pediu para parar, pois teria de me dar ordem de prisão. Eu gritava na porta do juiz que não sabia qual era o pior juiz da Vara de Família daquele fórum. “Ninguém decide nada, inúteis. Eu quero minha filha!”. Quanto mais eu gritava, mais gente descia para ver o que estava acontecendo. O policial me pedia com delicadeza para que parasse, repetia que seria obrigado a me dar ordem de prisão. Respondia, aos berros, que me prendesse, pois assim eu chamaria a imprensa e mostraria o que esses juízes “não” fazem. Que quem decide não é o juiz. Eu chutava a porta e esticava meus braços para ser algemada, “pode me prender, mas continuarei gritando na cela”.
   Enfim, me acalmei, após mostrar minha revolta, minha indignação e o estado de loucura que o sistema judiciário deixa as pessoas. Sou só mais uma. Fomos para o carro, mas Lucélia voltou ao gabinete do juiz, para pedir “desculpas”. Voltou sorridente, porque o Fórum só falava nisso e os comentários eram “coitada dessa mãe, faz dois anos que vem aqui e não consegue ver a filha”, “nossa, ela até demorou para surtar”. O juiz reconheceu a morosidade do caso, porém nada de efetivo aconteceu.
   No fim pergunto, foi pior para a outra parte, pegou mal para ele? Não, pois demorou um mês para o Ministério Público responder que eu poderia visitá-la numa sala fechada, monitorada por psicóloga e mais 3 meses para a outra parte acertar o dia. Ou seja, o pai amoroso ganhou mais 4 meses de afastamento, distanciamento e sepultamento. Não há o que comemorar. Se a guarda se revertesse hoje, não haveria o que comemorar. Não fazemos mais parte uma da vida da outra. Os danos causados são irreversíveis. Em mim, em minhas filhas.
   Na retrospectiva desse ano há muitas perdas: perdi em janeiro uma das minhas mais queridas amigas, continuei perdendo pessoas que amava, perdi saúde, perdi dinheiro, faço parte da legião de profissionais desempregados, driblando o mundo para chegar o fim do dia. Vi minha filha 14 vezes nas visitas semanais monitoradas, até chegar à exaustão, até não ter mais dinheiro para as passagens. Não nos vemos desde setembro. Ela não gosta de falar comigo por skype, nem pelo facebook. Não há telefonemas. É melhor para quem mesmo inventar mentiras? É melhor para quem proibir? Só é melhor para mentirosos e tiranos. Vence quem mente mais. A Justiça permite. Vence quem tem mais dinheiro. O sistema judiciário adora! A melhor coisa que aconteceu neste ano é que voltei a frequentar mais o cinema, minha fuga da realidade. Porque qualquer história é melhor do que a minha.

8 comentários:

  1. Queria estar ai pra te abraçar... pra te dizer que sinto daqui a sua dor. Que sei o que você passa. Queria estar aí pra te ajudar com Miranda... pra te levar ao cinema e poder te mostrar que na vida existe gente ruim. Mas existem pessoas dispostas a fazer o diabo pra ver o sorriso no rosto de um amigo.
    Dri, não sei como será 2014. Mas tenho fé que dias melhores virão. Pra você, pra nós.
    Fica bem...
    Bjss,
    Lív e Lelê ♥

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    1. Lívia, querida, eu sei que tem mais gente boa do que ruim neste mundo, mas é impressionante serem necessárias mil pessoas boas para consertar o estrago de uma ruim... obrigada, já me sinto abraçada :)

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  2. Surreal....tão absurdo e horrível que dá medo. Não confio mais na Justiça, em nenhum sentido e nenhum ramo dela. Sinto que os envolvidos nesta merda toda que é a Justiça brasileira só aproveitam de alguma forma do poder, do dinheiro para beneficio próprio. Gostaria de coração conhecer um Juiz do bem...alguém pode me dar um nome.

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    1. Olha, Simone, até acho que deve existir um juiz de bem... mas um juiz só não faz verão, se o promotor for ruim, se os advogados forem sem ética e agirem com litigância de má fé... não tem quem conserte mais... só uma reforma geral, tipo eleição para promotores e juízes, que fiquem no cargo durante um mandato e reeleitos se for desejo dos eleitores! Daí queria ver fazer tanta coisa errada ou coisa nenhuma...

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  3. Nao e nao Dri. ui presaeu tb gritei pelos pulmoes no forum no Natal dos Nobres de 2005 e fui detdita ! a unica vez que dormi na prisao na minha vida ! Fiz um escanda-lo gritava assim Ak todo mundo vai passar o Natal com seus filhos ne ?? fui chamada de louca ate pelo MP que deveria me representar. 2 noites depois eu soube que no meu Restaurante foi oferecido aos juizes de Tere um vvelissimo jantar de confartenizaçao e ele apresentou uma bobinha la como namorada !
    Sinto te dizer que nunca mais tive Natal com ela. detesto estas datas !Hj por ex ele ja esta embarcado b=num cruzeiro com ela pela Amazonia ! e eu nao ha vejo desde que ela foi para os EEUU , ou seja 3 anos. nunca mais. 9 anos sem elazinha !

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    1. Sim, Deborah, somos chamadas de loucas, infinitamente loucas, como se passar anos de tortura psicológica não levasse à loucura. A culpa não é nossa, nem da outra parte, a culpa é do Poder Judiciário, que demora tantos anos e é tão corrupto, que só consegue alimentar o ódio e a loucura. Justiça? Ninguém vai mais por Justiça e sim por Vingança!

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  5. Adri, você é uma sobrevivente, uma lutadora. Eu acredito que existe algo maior q nós, uma inteligencia suprema q criou tudo e governa tudo. Acredito na lei da ação e reação, por isso acredito que todos que fizeram muito mal a você, à Dora e à Miranda vão pagar por tudo. Enquanto esse dia não chega, continue lutando, não deixe que te vençam pelo cansaço. um beijo enorme no seu coração.

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