sexta-feira, 1 de abril de 2011

O Medo de Perdê-la

   Não teve encontro com minha filha, como eu  já imaginava. O bom de lidar com uma pessoa má é que você sempre espera o pior, então, não há decepção! E acabo de receber uma nova mensagem do guardião da minha filha: se posso ir ao encontro na segunda ou terça. Sim, posso, posso tudo, só não posso ficar nessa angústia desgraçada! O mal de lidar com uma pessoa má é que sempre fará de tudo para desestabilizar você. A ideia é me deixar ansiosa o final de semana todo, na segunda marcar para terça e na terça desmarcar. Caso aconteça o contrário, estarei no lucro.
  De novo meu amigo Angel. Como ele mesmo disse, minha história é tão "fudidamente triste" que chega a ser engraçado. E numa mensagem lembrou nossas descidas na Serra do Mar, ao som de Pixies, na época da faculdade, "se não morremos na estrada é porque ainda temos muito o que viver e, se sobrevivemos até aqui é porque ainda temos muito o que fazer". Mas desde ontem fiquei muito nostálgica, pensei nas escolhas erradas que fiz na vida - foram muitas - que me fizeram estar aqui onde estou, na frente desse computador, tentando contá-las.
  Quando fiquei grávida de Dora decidi tê-la, mesmo sem jamais ter planejado ser mãe e nem ter me imaginado nesse papel - escolha certa. O genitor dela entrou em desespero, chorou, queria que eu abortasse, disse que era muito novo, não tinha emprego, não estava preparado... mas eu, um mês antes de completar de 31 anos, num emprego estável, ganhando bem... me senti preparadíssima e com uma vontade enorme de ser mãe. Quando a placenta descolou aos 37 dias de gravidez e a médica, Dra Rosa Maria Neme, me disse que um acontecimento assim antes dos 3 meses seria aborto espontâneo na certa e que para levar essa gestação adiante teria de fazer repouso absoluto, tive mais certeza ainda. Senti que esperava um ser muito especial, que faria muita diferença não só na minha vida, mas no mundo! Tinha mais, Rosinha, como eu carinhosamente chamava essa mulher que me apoiou muito, disse que eu poderia perder o bebê até o sexto mês e que, se nascesse antes dos 7 meses, poderia ter lesões irreversíveis. Tudo ia contra, mas eu estava muito a favor. Queria e amava esse bebê!
  Foi quando me dei conta do quanto era amada. Meus amigos se revezavam nos cuidados comigo, já que eu não podia nem ficar em pé, era deitada mesmo, com as pernas para cima. Antes eu trabalhava 10 horas por dia, nadava 4 vezes por semana, tinha vida social hiperativa, competia nos finais de semana quando não viajava a trabalho. Parei tudo. Aprendi a bordar. Por sorte gostava muito de ler e ver filmes. Sou filha única, o que já elimina cunhados e sobrinhos. Meus pais moravam no Guarujá, meu pai já não estava bem, nem dirigia mais. Mas quem tem amigos, tem realmente tudo! Eles não me deixavam sentir só. Meu colega Ali Hassan sempre dava uma passada em casa, levava almoço, ia me pondo a par dos acontecimentos do trabalho - na comunicação do Sebrae-SP. O ator André Corrêa, meu amigo de adolescência, por sorte tinha voltado a morar em São Paulo, estava numa peça do Abujamra, e nas suas folgas de quarta-feira ia me presentear com seu brilho e mimos. O casal Gabriela e Angel (de novo) presença constante até o parto. Flavia Vieira se desdobrava nas terças e quintas para ficar comigo, até partir para os Estados Unidos quando eu já estava tranquila, no sétimo mês. A protetora dos animais Claudia Pentiocinas ia me divertir com suas histórias bizarras. Entre o salvamento de um cão perdido na estrada e outro, dava um jeito de passar em casa para me alegrar. E o amigo e jornalista Fábio Diegues? Dividiu momentos incríveis comigo, é padrinho da Dora. Tudo bem, ela nunca foi batizada, mas tem um padrinho maravilhoso.
  O genitor estava ocupado nos ensaios do Antunes Filho e em reuniões para a produção de um curta. Como eu tinha que fazer repouso absoluto, nada de sexo. E foi quando eu percebi a distância entre nós. Sempre me achei mais inteligente, charmosa e divertida do que gostosa. Que bater papo é mais interessante do que fazer sexo comigo. Tenho pra mim que quando a paixão passa, se não existir um mínimo de amizade e compatibilidade de assuntos, tudo acaba. Acreditava mesmo que tinha mais em comum com o genitor. Mas ele foi ficando cada vez mais ausente, distante... tanto que no sexto mês, quando Rosa Neme ficou admirada com minha disposição em repousar e acreditou que a gravidez seguiria firme e forte, tive muitas dúvidas se deveria me juntar com o figura, decidi que deveríamos sim morar juntos - escolha errada.
  Para se ter uma ideia, quem ajudou na mudança foi Flavia - sempre me ajuda em mudanças - e seu irmão Pedro, meu amigo e que foi também namorado. Eles encaixotaram tudo, depois desencaixotaram, arrumaram a casa e ainda preparam o jantar. Inesquecível macorranada! O genitor chegou na hora do jantar, com tudo pronto...
  Não fiquei preparando nada de quarto, roupas, não comprava nada até o sexto mês, coisa mais sombria montar o quarto para um bebê que poderia não nascer. Se perguntavam para quando seria o parto, respondia que, se nascesse, poderia ser de novembro a fevereiro. O André Corrêa, que não entendia muito dessas coisas de gestação, repetia isso para os amigos e as pessoas ficavam em choque com tamanha frieza, o que eu considerava hipocrisia. Era só a constatação do fato! Eu estava preparada para o pior. Talvez esse seja meu trunfo: estar sempre preparada para o pior.

Celebrar a  Vida

  O nascimento de Dora não poderia ter sido melhor. Em 9 de fevereiro de 2002, um sábado de Carnaval, eu dava a luz para uma menina linda, forte, de 3kg640gr, 47 centímetros, na maternidade Pro Mater, em São Paulo. Parecia uma festa, foi um acontecimento. Em certo momento havia 17 pessoas no quarto, era uma fauna de jornalistas e atores e familiares, todos muito falantes e de vozes poderosas, muito barulho. E aquela bebezinha ali, quietinha, atenta. Uma enfermeira entrou e pôs metade para fora, pois eu precisava descansar. Não! Por favor, eu já descansei demais! Quero festa, quero gente! Quero mostrar o quanto fui forte, o quanto me cuidei, o quanto desejei essa linda menina Dora! Só eu sei o quanto tive medo de perdê-la, em cada um dos 18 sangramentos em que tive que ir ao hospital saber se estava tudo bem, em cada pontada de dor, em cada lágrima, em cada sorriso... só eu sei!
  Esse medo fez parte de mim durante nove meses, paradoxalmente com a minha certeza de que ela nasceria perfeita! É tão "fudidamente triste" ter passado por tudo isso e sistematicamente vê-la arrancada de mim por oficiais de Justiça, policiais militares... não, esse é outro capítulo dessa história. Eu só queria celebrar a vida! Eu só queria amamentar, abraçar, beijar, ver a vida nela! Que realmente faz diferença no mundo, com suas tiradas engraçadas, com seu humor sagaz, com seu talento nato para a dança, com sua inteligência brilhante, alma solidária, amiga fiel, filha amorosa, criança feliz... era só o que eu desejava e desejo para Dora. Que seja feliz e que faça escolhas mais acertadas que sua mãezinha.

PS: Aos inúmeros amigos não citados, meus agradecimentos eternos, vocês fizeram parte desse milagre que foi o nascimento da Dora.

5 comentários:

  1. coisa linda tanta lembrança boa, Dri... emocionante demais! vc tem um coração imenso e generoso, é isso que aquele goblin não consegue engolir.
    não deixemos nunca que as forças ocultas do mal nos desestabilizem...
    vamos sempre celebrar a vida e o amor: Dorinha tem uma MÃE muito especial e uma irmãzinha amada, e muitos e muitos amigos que a amam!
    por ela, e com vc, seremos pacientes, até a vitória da verdade e do amor!

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  2. LINDO, simplesmente LINDO DEMAIS.
    Um depoimento de amor absoluto.
    Como já li um dia: "um amor sem limites, que brilha na nossa vida como milhões de Sóis."
    Quem é mãe sabe o que é isso.
    Todas as mães do mundo estão, realmente, com vc!

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  3. Oi Adriana querida! Só posso lamentar esse desfecho (que certamente é temporário pq o mundo e a vida são dinamicos) e, de outro lado prestar meu apoio à sua força e integridade como pessoa, como mãe.
    Que Deus te conserve assim, tranquila no seu amor e determinada diante desses obstáculos.
    Um grande beijo da Antonella - mãe da Mirellinha

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  4. Querida amiga, irmã, força.
    Só quem é mãe sabe o que é este amor incondicional, que enche nosso coração e nos dá a força de uma leoa lutando pela sobrevivencia de seu filhote contra o leão inimigo. Mãed é capaz de tudo pelo filho, até se jogar na água sem saber nadar, e salvar a criança.
    Essa força que nós temos ninguém mais tem...e este força vai trazer de volta nossa menina.
    Te amamos e estamos sofrendo juntos com vc, tentando dividir esta dor que vc sente agora. O mundo dá voltas e numa destas voltas da vida vamos todos nos encontrar.
    FORÇA....FORÇA....FORÇA...CORAGEM...CORAGEM...CORAGEM...SABEDORIA...MUITA SABEDORIA.

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  5. Adriana,

    me passa seu email.
    elainecesar@uol.com.br
    Obrigada
    Li todo seu blog.Que loucura!!1

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