segunda-feira, 14 de outubro de 2013

A Princesa que o Rei Não Quis

    Semana passada saiu a notícia sobre a ação movida pelos netos contra Pelé. A maioria das pessoas que eu conheço apoiou a  decisão dos meninos Octavio, 15 anos, e Gabriel, 13, que pedem pensão para o avô. Alguns criticaram, dizendo que só procuram o avô porquê é rico, porquê é o Pelé. Sim, claro que é por isso! Sentimento não se impõe. Se o avô é incapaz de dar atenção e amor, sentir qualquer afeto por seus netos, nada é possível fazer. Mas ele pode dar dinheiro. E isso a Justiça pode obrigar a dar.
    Acompanhei a saga de Sandra Regina, a filha que lutou judicialmente para ser reconhecida por seu pai. A menina cresceu na periferia do Guarujá, em Vicente de Carvalho. Sua mãe a criou sozinha e imagino como deve ter sido difícil para uma negra pobre, nos anos 60, ser mãe solteira. Imagino porque tenho uma filha sem pai, sou branca, classe média e com formação superior e minha filha  nasceu em 2009. Mesmo assim fui olhada muitas vezes com preconceito, quando segurava a bebezinha de meses e as pessoas diziam: que linda! Deve ser a cara do pai! "Ela não tem pai, mas sim, se parece com o genitor". Nossa! Me olhavam com espanto. Como se fosse crime ser mãe solteira. Um pai que não quer nem conhecer a filha é muito bem aceito nessa sociedade patriarcal. A culpa é da mulher que não se preveniu ou tentou dar um golpe. Pior é saber que muitas mulheres também pensam dessa forma machista.
   Então imagino, só imagino, o que a mãe de Sandra Regina sofreu. Mesmo assim criou sua filha dignamente. Aos 11 anos a menina insistia muito em saber quem era o pai. Até que a mãe contou. Seu pai era o *Rei Pelé! A garota ficou exultante e logo percebeu que seus traços eram muito parecidos  com os de Edson Arantes do Nascimento. Ingênua, contou para todos na escola a novidade. Sofreu todo tipo de humilhação, começou a ser chamada de princesa, gata borralheira, de forma pejorativa. Ninguém acreditava que ela era filha do Rei. 
    Sandra cresceu em Santos e muitos, assim como eu, sabiam da sua história. No início dos anos 90 ela trabalhava numa loja de brinquedos, em frente ao apartamento do meu amigo Fábio Diegues. Muitos frequentavam a loja, nem tanto para fazer compras, mas para constatar a semelhança entre pai e filha. 
    Então a ciência facilitou a vida daquela menina, com o advento do exame de DNA. Já adulta entrou na Justiça para ser reconhecida, nem tanto pelas humilhações que passou, mas por sua mãe. E já no primeiro exame deu positivo, claro. Mas o "Rei" recorreu e com sua soberba, exigiu que fosse feito outro exame em Boston (EUA), já que não confiava nos laboratórios brasileiros. Positivo novamente. Mas a Justiça funciona de uma forma bizarra. O pai, que não queria reconhecer a filha, recorreu não duas ou cinco vezes. Foram onze vezes. Até que um dia, nem todo o dinheiro ou influência do mundo, conseguiu dar jeito de se embrenhar nas brechas judiciais. Sandra Regina, finalmente, teve o nome do pai em seu registro de nascimento. A mulher Sandra foi vereadora em Santos, casou-se e teve dois meninos, que jogavam um bolão. O avô nunca foi vê-los jogar.
     Sandra ganhou na Justiça, mas perdeu a batalha para o câncer de mama, morreu em 2006. O pai lhe enviou, pela primeira, única e última vez, flores. Mas não foi pessoalmente no velório ou enterro. Seus filhos, na época com 8 e 6 anos, perderam uma mãe amorosa numa idade em que a mãe é fundamental (e qual idade não é?). Segundo o advogado desses meninos, suas mensalidades escolares estão atrasadas e eles não tem lazer. Em suas certidões de nascimento consta o nome do avô materno. Essa batalha a mãe já venceu por eles. Falta agora uma pensão.
      De certa forma acredito que Sandra teve sorte em não ser criada ou ter vínculo com seu pai biológico. Foi uma mulher digna, não teve qualquer problema judicial em sua vida, casou com um bom homem, foi muito bem votada pelos eleitores santistas. Já o filho príncipe do Rei, aquele que teve tudo, que foi um goleiro medíocre* do Santos Futebol Clube, que teve a presença do pai em toda a sua vida, a torcida nos campos, enfim, toda a influência do Rei, envolveu-se com o tráfico de drogas e, por opção, resolveu financiar o crime. Não era um doente, dependente químico, como tantos jogadores conhecidos por aí. Não, esse queria o poder da criminalidade, não apenas usar a droga.
       Penso que Pelé é um mito, um jogador extraordinário. Mas o homem Edson Arantes do Nascimento deixou a desejar, não só na integridade e nas atitudes, mas também quando assumiu a pasta do Ministério dos Esportes. Poderia ter feito tanto, aproveitando o seu reconhecimento mundial, poderia ter mudado a vida de tantas crianças e adolescentes. Mas nada fez. Quem sabe agora ele faça algo por seus netos, nem que seja por ordem judicial.

*    Essa síndrome de monarquia brasileira me irrita.
** O medíocre, no caso, é literal, alguém que não é melhor, nem pior. O filho de Pelé não foi o melhor, nem o pior goleiro do S.F.C.

8 comentários:

  1. Compartilho da tua opinião. E espero que os meninos ganhem isso logo.

    Outro Rei - o Roberto - tem uma atitude bem diferente: alega que é filho dele e pode provar isso? Reconhece sem churumelas.

    Ronaldo é outro.

    O nosso rei é só um hipócrita, como bem diz (nosso mau humorado) Coutinho.

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    1. Eu também espero que eles ganhem logo isso, porque sei o quanto o sistema judiciário alimenta a morosidade. Sandra sofreu demais e seus filhos também com sua perda. E esse "rei" continua sendo reverenciado por outros milhões de hipócritas...

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  2. Fantástico esse texto! Eu acompanhei esse caso e desde então tenho nojo do Pelé. Não adiante dizerem que ele é o melhor jogador do mundo nada justifica o fato de que Pelé é um homem sem caráter. E gente sem caráter não tem valor, mesmo que seja o melhor jogador do mundo.

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    1. Obrigada Julia! Ele foi o melhor jogador do mundo, mas nem sei se foi o de todos os tempos, porque os tempos são outros e tem tipo o Neymar, que nem exigiu exame de DNA... bjs

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  3. Este é de fato um blog feminista, que escancara de forma sensível, clara e forte, com o seu dom de escrever, a realidade opressora do sistema patriarcal e machista em que vivemos... É o que tão bem mostra este texto e tantos outros, como o das mães-blogueiras que como vc sofrem alienação parental...
    Chocada com a história, nem sabia da morte trágica e precoce desta guerreira (e de câncer na mama... não tenho dúvidas da ligação entre a explosão desta doença nela e o processo tão arrastado, a rejeição tão dolorosa...). Triste demais.
    Edson Arantes do Nascimento é indigno do mito Pelé, é um conservador, machista, de direita e sim, também racista, preconceituoso e discriminador. Esta história merece ser muito divulgada, para que definitivamente não se confunda mais o mito com o homem que ele realmente é. Parabéns de novo pelo texto!

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    1. Obrigada Gab! Cada vez mais feminista sim. O feminismo é o combate ao machismo e não sua versão feminina. Acreditava na "não distinção de gênero", nunca fui sexista, mas é tanta opressão contra a mulher que não dá para suportar. Quando escrevi esse texto uma amiga disse que agora até o Pelé vai querer me processar. Não, pq tudo isso é verdade, foi publicado, amplamente divulgado, mas sempre abafado. E se quiser me processar, pega senha e entra na fila...

      Obrigada de novo!

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  4. Pelé, vc é um vacilão de primeira. na verdade vc deveria se chamar Pémerda!!!
    Faz filho e não assume, fugiu ou tentou fugir o máximo de seus compromissos e nem para respeitar a enfermidade de uma mulher que morreu clamando pelo amor de seu pai. Flores, tem que se dar em vida, Pémerda!!!

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  5. Pelé, vc é um vacilão de primeira. na verdade vc deveria se chamar Pémerda!!!
    Faz filho e não assume, fugiu ou tentou fugir o máximo de seus compromissos e nem para respeitar a enfermidade de uma mulher que morreu clamando pelo amor de seu pai. Flores, tem que se dar em vida, Pémerda!!!

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